Na Hipocrisia do mundo você se descobre,
e, se encontra, quando vive um grande amor
Vicente Alencar

segunda-feira, 18 de maio de 2015

Chegou a Domingueira Poética de 17/05/2015 - reflexões sobre o lixo

Prezadas/os

Ontem foi dia do lixeiro, perdão, dia do gari, uma nobre profissão. 

Claro que é nobre! Já imaginou sua vida sem eles? 

Tem gente - no meu tempo chamavam-se Sugismundos - que suja a rua com o simples argumento de que "assim ajudamos a dar emprego aos garis". Quem pensa assim poderia, por exemplo, muito contribuir para manutenção dos empregos dos coveiros "se auto eliminando-se a si mermo" (sic) da sociedade de uma vez por todas.

Pesquisando sobre a origem e o significado dessa palavra, descobri o seguinte:

1 - Não é de origem francesa (para embelezar o nome?). Que nada! A palavra gari vem do nome de Pedro Aleixo Gari que, durante o Império assinou com a Corte brasileira o primeiro contrato de limpeza urbana no Brasil. Aleixo costumava reunir no Rio de Janeiro, cidade onde morava, funcionários para limpar as ruas após a passagem de cavalos, o que nessa época era muito comum.

2 - Os primeiros cariocas se acostumaram com esse trabalho e sempre mandavam chamar a "turma do Gari" para executá-lo. Aos poucos e de tanto repeti-lo, a população da do Rio associou o sobrenome de Aleixo Gari aos funcionários que cuidam da limpeza das ruas. Assim, o nome gari se espalhou para o restante do País. 

3 - Gari também pode ser um tsukemono, uma espécie de conservas de vegetais - picles -  da culinária japonesa. Chique, né?

4 - Os garis tem um poder oculto que ainda não sabem como aplicar: podiam varrer essas essa sujeirada meio invisível que assola o mundo sob as mais terríveis formas (tráfego de drogas, corrupção, destruição do meio ambiente, poluição, guerras santas, genocídios e outras vergonhas da espécie humana). Mas, para isso, seriam necessários milhares e milhares de Super-garis. Oremos, pois. 



Se vc não gostou do que leu até aqui, pode jogar tudo na sua lixeira virtual, sem culpa. 

Caso contrário, leia o divertido texto abaixo de autoria do Veríssimo, dizem. 

Bom domingo.


O lixo - Luís Fernando Veríssimo

Encontram-se na área de serviço. Cada um com seu pacote de lixo. É a primeira vez que se falam.
- Bom dia...
- Bom dia.
- A senhora é do 610.
- E o senhor do 612
- É.
- Eu ainda não lhe conhecia pessoalmente...
- Pois é...
- Desculpe a minha indiscrição, mas tenho visto o seu lixo...
- O meu quê?
- O seu lixo.
- Ah...
- Reparei que nunca é muito. Sua família deve ser pequena...
- Na verdade sou só eu.
- Mmmm. Notei também que o senhor usa muito comida em lata.
- É que eu tenho que fazer minha própria comida. E como não sei cozinhar...
- Entendo.
- A senhora também...
- Me chame de você.
- Você também perdoe a minha indiscrição, mas tenho visto alguns restos de comida em seu lixo. Champignons, coisas assim...
- É que eu gosto muito de cozinhar. Fazer pratos diferentes. Mas, como moro sozinha, às vezes sobra...
- A senhora... Você não tem família?
- Tenho, mas não aqui.
- No Espírito Santo.
- Como é que você sabe?
- Vejo uns envelopes no seu lixo. Do Espírito Santo.
- É. Mamãe escreve todas as semanas.
- Ela é professora?
- Isso é incrível! Como foi que você adivinhou?
- Pela letra no envelope. Achei que era letra de professora.
- O senhor não recebe muitas cartas. A julgar pelo seu lixo.
- Pois é...
- No outro dia tinha um envelope de telegrama amassado.
- É.
- Más notícias?
- Meu pai. Morreu.
- Sinto muito.
- Ele já estava bem velhinho. Lá no Sul. Há tempos não nos víamos.
- Foi por isso que você recomeçou a fumar?
- Como é que você sabe?
- De um dia para o outro começaram a aparecer carteiras de cigarro amassadas no seu lixo.
- É verdade. Mas consegui parar outra vez.
- Eu, graças a Deus, nunca fumei.
- Eu sei. Mas tenho visto uns vidrinhos de comprimido no seu lixo...
- Tranqüilizantes. Foi uma fase. Já passou.
- Você brigou com o namorado, certo?
- Isso você também descobriu no lixo?
- Primeiro o buquê de flores, com o cartãozinho, jogado fora. Depois, muito lenço de papel.
- É, chorei bastante, mas já passou.
- Mas hoje ainda tem uns lencinhos...
- É que eu estou com um pouco de coriza.
- Ah.
- Vejo muita revista de palavras cruzadas no seu lixo.
- É. Sim. Bem. Eu fico muito em casa. Não saio muito. Sabe como é.
- Namorada?
- Não.
- Mas há uns dias tinha uma fotografia de mulher no seu lixo. Até bonitinha.
- Eu estava limpando umas gavetas. Coisa antiga.
- Você não rasgou a fotografia. Isso significa que, no fundo, você quer que ela volte.
- Você já está analisando o meu lixo!
- Não posso negar que o seu lixo me interessou.
- Engraçado. Quando examinei o seu lixo, decidi que gostaria de conhecê-la. Acho que foi a poesia.
- Não! Você viu meus poemas?
- Vi e gostei muito.
- Mas são muito ruins!
- Se você achasse eles ruins mesmo, teria rasgado. Eles só estavam dobrados.
- Se eu soubesse que você ia ler...
- Só não fiquei com eles porque, afinal, estaria roubando. Se bem que, não sei: o lixo da pessoa ainda é propriedade dela?
- Acho que não. Lixo é domínio público.
- Você tem razão. Através do lixo, o particular se torna público. O que sobra da nossa vida privada se integra com a sobra dos outros. O lixo é comunitário. É a nossa parte mais social. Será isso?
- Bom, aí você já está indo fundo demais no lixo. Acho que...
- Ontem, no seu lixo...
- O quê?
- Me enganei, ou eram cascas de camarão?
- Acertou. Comprei uns camarões graúdos e descasquei.
- Eu adoro camarão.
- Descasquei, mas ainda não comi. Quem sabe a gente pode...
- Jantar juntos?
- É.
- Não quero dar trabalho.
- Trabalho nenhum.
- Vai sujar a sua cozinha?
- Nada. Num instante se limpa tudo e põe os restos fora.
- No seu lixo ou no meu?

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Antonio Pastori, guardião da Domingueira Poética
+55 (21) 99911- 8365

Caso não queira receber mais nossas mensagens, envie um e-mail para  domingueirapoetica@gmail.com  pedindo para ser excluído  do grupo.



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