Na Hipocrisia do mundo você se descobre,
e, se encontra, quando vive um grande amor
Vicente Alencar

quarta-feira, 5 de dezembro de 2018

O PECADO DE MANIPULAR O GENOMA HUMANO – QUE NEPOMUCENO TEM A VER COM ISSO?


O PECADO DE MANIPULAR O GENOMA HUMANO – QUE NEPOMUCENO TEM A VER COM ISSO?
Em 28-11-18 foi comunicado fato (a ser comprovado) destinado a ser passo revolucionário na História da Medicina. O pesquisador chinês He Jiankui anunciou duas bebês (Lulu e Nana), cujo genoma foi modificado por ele. A façanha foi vista como verdadeira ruptura na criação do homem e como impensável possibilidade de controlar a evolução das espécies. A tecnologia consiste na precisa manipulação do DNA da célula germinativa, por meio de nucleases programáveis (sistema CRISPR/Cas), capaz de corrigir ou introduzir mutações, trazendo a esperança de curas de doenças ou então o temor de inimagináveis maldades. O filho da nepomucenense Mariana Veiga, João Batista Veiga Sales, brilha na história dessa tecnologia. Nos EUA, ele colaborou com o asturiano Severo Ochoa, que, com Arthur Kornberg, recebeu o prêmio Nobel em Medicina de 1959, pela descoberta da síntese do DNA.
Em dezembro de 1969, o professor Aparício Silva de Assis realizou o primeiro transplante de órgãos, no caso o rim, em Minas, sendo o segundo do Brasil. Depois, o cirurgião me pediu para ser o co-orientador da tese, também pioneira, de meu fraternal amigo e ex-colega de república Francisco Ozeias de Carvalho, sobre a avaliação dos transplantes até então realizados. Os elogios que o mestrando recebeu foram tantos que o Aparício propôs um livro sobre ética dos transplantes e me pediu uma introdução histórica, a partir da ética da transfusão de sangue.
O Aparício vinha conversando comigo sobre isso, principalmente a propósito da publicação do Simpósio Ciba intitulado ETHICS IN MEDICAL PROGRESS: WITH SPECIAL REFERENCE TO TRANSPLANTATION, de 1966.  Ele convidou co-autores e a alguns deles assustou a abrangência corajosa do livro, com tópicos melindrosos: por exemplo, a possibilidade do comércio de órgãos, a interface com a religião ou o conflito entre especialistas. Daí que a obra ficou emperrada, mas, se fosse publicada, teria sido pioneira, mesmo fora do país. Minas Gerais, aliás, sempre teve responsabilidade histórica no trato da ética, desde a tese  ENSAIO SOBRE O ESTUDO DA VIDA,  defendida com brilho na Faculdade de Medicina de Paris, em 1837, pelo médico mulato mineiro Camilo Maria Ferreira Armond, mais conhecido como Conde de Prados. Foi um texto elaborado em momento crucial de guinada doutrinária da medicina e hoje pode ser lido em português, na tradução feita por meu distinto ex-aluno e abnegado historiador da medicina barbacenense, Paulo Maia Lopes. 
O abortamento daquele livro nos poupou de sermos transformados em bioeticistas, uma especialização que denunciei depois como espúria. Minha denúncia ocorreu depois de minha participação no Comitê de Ética da Pesquisa da UFMG e deriva das seguintes perguntas, que flagram o farisaísmo inerente a tais especialistas. Como explicar que aos hospitais, principalmente aos universitários, seja exigido rigoroso controle ético da pesquisa em sujeitos humanos, sem que igual exigência seja feita para os aspectos éticos do ensino e da atenção à saúde?  E por que o conselho nacional que trata da atenção à saúde deixa de cuidar da ética desta atenção para cuidar da ética da pesquisa? Por que o conselho nacional que trata da pesquisa não cuida da ética da pesquisa? Por que o conselho nacional que trata da educação não cuida da ética da educação? Por que as convenções sobre bioética são financiadas por corporações privadas, envolvidas no gigantesco lucro potencial da terapia genética?
O tumulto internacional causado por He Jiankui tem muito a ver com tais perguntas.

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