Na Hipocrisia do mundo você se descobre,
e, se encontra, quando vive um grande amor
Vicente Alencar

sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

"A Louca de Albano"


"A Louca de Albano" do Pampa (de Alma Welt)

Noites do meu pampa, estrelas nuas
Que me vêem como sonâmbula vagar
Esperando me elevar à luz da lua,
Pequena e branca gôndola no ar!

Me conhecem os peões e suas prendas,
Esta “louca de Albano” desvairada,*
Que sai de sua cama toda em rendas
Para andar no jardim, de madrugada,

Pois que não resisto aos seus apelos,
Noites e luas sedutoras da planura,
Que me puxam no leito os cabelos

E que, antigos, meus delírios alimentam
(sou eu a lenda viva que comentam)
Na sutil voragem branca de loucura...



Nota
*...louca de Albano- Nossa mãe, Ana Morgado, catarinense neta de açorianos, nos contou esta estória antiga, portuguesa, em versos, de autor anônimo, apreendida com seus avós, e costumava chamar a Alma de "louca de Albano" como indignada censura quando alguém denunciava (sem dúvida Solange, nossa irmã) que ela vagara nua, de noite, pelo jardim ou pela pradaria, ou outra aventura bizarra de minha irmã. Por curiosidade transcrevo-a aqui:

A Louca de Albano

Anda cá, meu filho, escuta:
És amigo de sua mãe?
Oh, minha mãe, que pergunta?
Basta, meu Paulo, pois bem.
Vai ver a velha Vicenza
o amor que o filho lhe tem.
Faz hoje 20 anos
que teu pai morreu
a golpe deste ferro,
para meu mal e eu,
a vir vingá-lo,
fiz uma jura fatal...
Uma jura? Mãe santíssima!
Oh, minha mãe, o que jurou?
Eu jurei por este sangue,
que em ferrugem se tornou,
que tu Paulo matarias,
quem teu pai matou.
E matas, meu filho?
Mato.
Matas, seja quem for?
Ainda que esta vingança
lhe roube do seio o amor?
Mato.
Tome este ferro, é Ricardo o matador.
Ricardo, o pai de Maria?
Oh, minha mãe, perdoai...
Pela amante o pai esquece,
filho ingrato, parte e vai,
cumpre a jura ou sê maldito
se não vingares a teu pai.
Nesta noite, tinto em sangue,
com os cabelos no ar,
o assassino de Ricardo,
foi aos pés da mãe prostar
o punhal com que jurara,
do pai a morte vingar.
Riu-se a velha de contente
e abraçou o vingador,
mas que de súbito aparece
na porta uma estátua de dor:
Paulo, meu Paulo, perdi meu pai, não vês?
As lágrimas que aqui derramo
assistiram ao triste fim.
Quis falar-me e já não pode,
com os olhos fixos em mim,
expirou... "Vingança eterna".
Tu vingas, meu Paulo, sim?
Vingo, Maria, sossega,
eu sei quem teu pai matou,
vai morrer com o mesmo ferro
que a pouco o transpassou.
Assim disse e a punhalada
no próprio peito cravou...
Foge a moça espavorida,
deixa Albano sem parar,
chega a Roma no outro dia,
por toda parte a gritar:
"Quem me mata por piedade,
quem me acaba de matar?"
E assim vagou três dias,
e no quarto enlouqueceu,
quando passa o viajante,
quando passa o Coliseu,
vê a triste às gargalhadas,
vingança pedindo a Deus...
Ha, ha, ha, ha, ha, ha, ha...


Nenhum comentário: