A
ESCOLHA DE SOFIA
A
escolha de Sofia é um filme no qual uma mãe, prisioneira dos nazistas, é
forçada a escolher um dos filhos para a câmara de gás. Ouço de leitores a
queixa de que não têm em quem votar. Faltam candidatos e partidos qualificados.
O voto criterioso deve considerar a experiência administrativa, a necessária
habilidade para lidar com o Congresso, equilíbrio e moderação indispensáveis à
pacificação da sociedade, probidade, renovação dos quadros políticos, força,
impetuosidade e coragem para romper com os velhos vícios da vida pública,
quebrando o mecanismo da corrupção, qualificação intelectual, plano de governo
e uma base partidária sólida para governar.
Tudo
isso junto seria como se a mãe do filme aludido pudesse salvar ambos os filhos.
Escolher alguns dos critérios, renunciando aos demais é uma “escolha de Sofia”.
Experiência administrativa e política não anda de braços dados com a renovação
da vida pública. O chamado sangue novo não é certidão de capacidade
administrativa nem de aptidão para difícil negociação com o Congresso,
governadores, prefeitos, variados grupos de pressão e outros atores políticos.
Já se disse que o Brasil não é para principiantes. Renunciar à renovação das
lideranças e das práticas políticas em nome da ruptura com as velhas práticas é
uma escolha difícil.
Optar
pelos experientes, hábeis na negociação, veteranos do jogo tradicional do
político esgotado, com todos os seus vícios, é jogar fora a oportunidade
histórica de mudar o que deve ser mudado. A habilidade política da experiência
é uma certidão de envolvimento com os vícios do patrimonialismo caracterizado
pela troca de favores e a indiferenciação do patrimônio público em face do
privado.
A
indispensável probidade é uma exigência diante da qual só sobrevivem os
estranhos no ninho da política. Estes, não tendo praticado jogo sujo, não
tiveram acesso a cargos no Executivo nem na liderança do Legislativo. Não
revelaram “habilidade política”. Permaneceram no baixo clero do Congresso ou
não passam de neófitos na política. São despreparados. Podendo ser impetuosos. Representam
renovação de condutas e a quebra do mecanismo apodrecido da política. Estas
qualidades geralmente não andam em companhia do preparo intelectual, do
equilíbrio e da moderação. Poderá, um ator com perfil de “rompe mato”,
apresentar planos feitos por algum técnico. Mas isso pouco ou nada significa.
Já a base partidária sólida e a promessa de governabilidade é também um
compromisso de continuidade de tudo que a nação não suporta mais.
Não temos escolha
indolor, seja com uma liderança personalista do tipo impetuoso, seja um
conciliador de atitudes lenientes. Crise da continuidade de um modelo que já
não funciona ou crise de uma ruptura: eis a escolha de Sofia.
Fortaleza, 20 de agosto
de 2018.
Rui Martinho Rodrigues.
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