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e, se encontra, quando vive um grande amor
Vicente Alencar

quarta-feira, 7 de setembro de 2016

Choro de Cardozo e campanha suja de João Santana têm a mesma fonte - 04/09/2016 - Samuel Pessôa - Colunistas - Folha de S.Paulo

Choro de Cardozo e campanha suja de João Santana têm a mesma fonte - 04/09/2016 - Samuel Pessôa - Colunistas - Folha de S.Paulo
Data: 04/09/2016 21h10min39s UTC

samuel pessôa <http://www1.folha.uol.com.br/colunas/samuelpessoa>

É formado em física e doutor em economia pela USP e pesquisador do Instituto
Brasileiro de Economia da FGV. Escreve aos domingos.
Choro de Cardozo e campanha suja de João Santana têm a mesma fonte
Pedro Ladeira/Folhapress

O advogado José Eduardo Cardozo durante coletiva sobre impeachment
da ex-presidente Dilma
04/09/2016 02h00

O prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), considera o impedimento da
ex-presidente Dilma Rousseff um golpe qualificado, institucional. Destituir
a presidente observando todos os ritos legais qualificaria o golpe. A
definição do prefeito encerra uma contradição em termos.
Fazendo um esforço de racionalização da lógica de nosso prefeito, eu diria
que golpe qualificado seria atuar nas zonas cinzentas da lei. Funciona
assim: todo contrato é incompleto. Não é pos sível prever todas as injunções
e estados da natureza. Para que as instituições funcionem, é necessário
haver compreensão compartilhada dos participantes e, além do cumprimento dos
ritos legais, boa vontade na observância do espírito da lei.
O golpe qualificado seria infringir o espírito da lei, mesmo que observando
todos os ritos legais. Impedir a presidente por causa de pecadilhos fiscais
seria punição excessiva. Emprega-se detalhe legal menor como subterfúgio
para atingir o objetivo maior: tirar o PT do poder. Esse seria o golpe.
Em que pese o juízo de valor de nosso prefeito de considerar a gestão fiscal
de Dilma detalhe legal menor, ele não percebeu que a sua definição de golpe
qualificado transforma a eleição de Dilma em golpe qualificado.
Dilma foi eleita observando todos os ritos legais. O grupo político petista,
para não perder a eleição, se dispôs a tudo. Produziu deficit fiscal, já
"despedalado", a preços de hoje, de quase R$ 100 bilhões; mentiu à larga;
demonizou os adversários etc. O PT, para se perpetuar no poder, atuou em
todas as zonas cinzentas possíveis e imagináveis no processo eleitoral.
Mentir sobre a situação fiscal do país é tão grave quanto esconder da
população que há uma epidemia de meningite, por exemplo.
No presidencialismo brasileiro, o presidente é extremamente forte. Tem
imenso poder de criar recursos e distribuir gastos. Um grupo político
disposto a tudo fazer para se perpetuar no poder constitui enorme risco ao
funcionamento da democracia. Degenera-se facilmente em tirania. A Venezuela
demonstra.
O suposto golpe qualificado corrige o golpe qualificado anterior, a eleição
da presidente.
Entende-se agora a fonte do choro de José Eduardo Cardozo. Ela vem do mesmo
lugar de onde veio a campanha suja de João Santana. Da soberba do PT e de
sua superioridade moral autoconcedida.
O choro é do João valentão que bate em todos na rua. Um dia, uma nova
família se muda para o bairro. Aparece outro maior e mais forte e bate no
João. Que retorna à casa chorando.
Oxalá o impedimento da presidente Dilma civilize o PT para a convivência com
nossas instituições políticas extremamente consensuais e ensine que
responsabilidade fiscal é um valor caro à nossa sociedade, do qual não se
pode dispor ao sabor dos projetos de grupos políticos de alma autoritária.

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