Na Hipocrisia do mundo você se descobre,
e, se encontra, quando vive um grande amor
Vicente Alencar

segunda-feira, 6 de abril de 2020

E DEPOIS? Fortaleza, 6/4/20. Rui


E DEPOIS?

Napoleão Bonaparte (1969 – 1821) tomou Moscou. George Walker Bush (1946 – vivo) tomou Bagdá e comemorou o fato, a bordo de um porta-aviões, como vitória. Era cedo demais para festejo, em ambos os casos. Guerras exigem a definição de objetivos. Alcançá-los pode ser necessário. Não significa que seja suficiente. Durante a guerra de guerrilhas na República de El Salvador houve nos EUA quem pressionasse por uma intervenção militar. Os chefes militares foram contrários. Diziam que era preciso ter objetivos bem definidos para depois da ocupação do país, lembrando o Vietnã.

Vivemos uma peste medieval, caracterizada pela falta de vacina ou antiviral específico e a grande infectividade do agente etiológico, propiciando rápida propagação da enfermidade. A baixa patogenicidade enseja portadores assintomáticos que espalham o vírus. A letalidade é baixa, mas imensa quantidade de infectados faz da relativamente pequena quantidade dos casos fatais, em números absolutos, uma tsunami de óbitos. Os serviços de saúde e o setor funerário são calapsados. É preciso tomar a capital inimiga, como Bagdá. Istó é: recorrer ao isolamento social. Seriam insuportáveis as consequências, se não o fizéssemos.

Tomar a capital inimiga é modificar a curva de Gauss, o famoso gráfico da distribuição normal dos dados de um fenômeno, desacelarando a propagação da pandemia, dando tempo aos serviços de saúde para que se preparem. Teremos vitória. As perdas humanas serão menores com o distanciamento social. Nada é mais importante do que isso. “Bagdá” será tomada. E depois? Não devemos hesitar, mas planejar para o amanhã. Comecemos pelas indagações norteadoras das providências. Quanto tempo poderia permanecer em Moscou, esperando a rendição dos Russos? Qual é o tamanho do problema posterior a tomada de Bagdá?

Haverá inadimplência generalizada, insolvência de empresas, famílias (consumidores) e entes públicos? Caso fortuito e força maior, e fato superveniente serão argumentos inafastáveis na defesa dos devedores e da quebra de contratos. Como reorganizar a vida pós-peste? Falidos e descapitalizados poderão fazê-lo? O Leviatã assumirá tudo, seguindo o modelo soviético? Ou a dinamicidade da iniciativa privada se tornará ainda mais necessária, a exemplo do ocorrido quando do desmoronamento do Império Romano, quando poderes particulares deram origem aos feudos? As moedas nacionais se esfacelarão em decorrência do gigantesco desequilíbrio fiscal e da hiperinflação consequente? Ou o descumprimento generalizado de obrigações possibilitará o equacionamento das dívidas públicas e privadas?

Os estados nacionais serão fortalecidos ou a necessidade de coordenação de esforços dará lugar a um poder supranacional, semelhante a um governo mundial? A preocupação com novos eventos semelhantes e sucessivas ondas da atual pandemia promoverá limitações draconianas da liberdade de locomoção, de expressão do pensamento (no resguardo de uma ciência havida como dogmática), com ativos financeiros controlados pelo Grande Irmão da ficção de Eric Arthur Blair (George Orwell, 1903 – 1950)? Os que confiam no Leviatã (funcionarios públicos e políticos) estão esfregando as mãos. Libertários se dividem. Há os que têm esperança do enfraquecimento do Estado, como ocorreu após a queda do Império Romano. O estabelecimento de uma nova ordem, porém, passa por um período tumultuado, quando aparecem os senhores da guerra, que são bandidos poderosos, conforme exemplo da Somália, Uganda e Haiti. Correntes totalitárias podem se fortalecer, como tantas vezes se viu após crises profundas.

Fortaleza, 6/4/20.

Rui

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