A
GRANDE CALAMIDADE
A
atual pandemia provocou o calápso da rede hospitalar nos países desenvolvidos, dotados
de excelentes serviços de saúde e causou o desmoronamento do setor funerário,
bem como dos necrotérios, a exemplo do ocorrido na França, Itália e em algumas
cidades dos EUA. Temos um cataclisma de proporções inéditas. Grandes flagelos
comprometem as atividades governamentais regulares. Quem administra bens
públicos gerencia patrimônio alheio, submetendo-se, por isso, ao princípio
segundo o qual tudo que não for expressamente autorizado é proibido.
A
LOA (Lei Orçamentária Anual) define limites para os gastos e determina os fins
aos quais devem servir. Os necessários procedimentos de controle impõem um
ritmo lento aos gestores estatais. Desastre não podem esperar licitações e
demais procedimentos burocráticos, nem respeitam limites orçamentários legais.
A LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal, lei complementar 101, de quatro de maio
de 2000) contempla a urgência das necessidades impostas por eventual hecatombe,
regulamentando condutas em face de calamidade pública. Relaxa os procedimentos
de controle e suspende limites orçamentários, resultados fiscais previstos na
LOA e permite a realocação de recursos, entre outras medidas. A grave situação
criada pelo coronavirus impõe, muito claramente, a necessidade de decretação do
estado de calamidade pública. O Executivo solicitou e o Congresso aprovou a medida,
até então inédita no âmbito da União. Estados e municípios, com fundadas
razões, estão adotando ou já adotaram providência idêntica, sem que tenham
demonstrado a necessidade, como se a pandemia atingisse simultaneamente e nas
mesmas proporções todos os 5.570 municípios brasileiros.
O
Congresso está se mostrando pródigo em medidas assistenciais. Inúmeros projetos
estão sendo apresentados criando ou majorando novos e velhos benefícios. O
reconhecimento de situações graves, somado a necessária adoção de providências
antes que o cataclisma se configure podem justificar as medidas preventivas do
estado de calamidade, inclusive em municípios que ainda não foram atingidos.
Pedidos de socorro financeiro, partindo dos estados e dirigidos à União, estão
se multiplicando. Não esqueçamos, todavia, que a maioria dos estados já se
encontrava em situação de calamidade financeira antes da pandemia. Municípios,
em sua maioria, são financeiramente inviáveis. A LRF e a LOA, diante da grave
situação, têm os seus controles relacionados. Não é exagero, porém, pensar que
o Macunaíma vai se aproveitar disso para agir, sem medo da Lava Jato, sem medo
da imprensa que está inteiramente voltada para o vírus.
Tristes trópicos, como
diria Claude Lévi-Strauss (1908 – 2009). Não se trata de discutir a gravidade
da situação; nem transformar um problema de natureza técnica em problema
político. Tampouco de recusar os procedimentos excepcionais da condição legal
definida como calamidade pública. A vigilância do Tribunal de Contas da União,
da Controladoria Geralda União não poderia ser exercida plenamente, submetendo
providências urgentes ao compasso burocrático de rotina. Os parlamentos dos
diversos entes federativos, porém, podem fiscalizar sem retardar o andamento
administrativo das providências necessárias. Registre-se, finalmente, que os
órgãos de imprensa devem preencher a lacuna deixada pelo afrouxamento dos
controles necessários ao enfrentamento da crise.
Fortaleza, 9/4/20.
Rui Martinho Rodrigues.
Publicado no blog da
ACLJ e no focus.jor.
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