Sertão virando mar
Sertão virando mar
Geraldo Duarte*
Grata e festiva Fortaleza recebeu a visita do Frei Vidal da Penha e hospedou-o na melhor casa da vila.
O devoto das Dores de Nossa Senhora chegou para evangelizar, rezar missas, fazer sermões, lançar profecias e realizar misteres das Santas Missões.
No andejar pela Bahia, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Ceará e Piauí, ao concluir as incumbências, fincava um cruzeiro, nominado Cruz das Almas, como ato de fé.
Mas, das bênçãos, quando descuidado o múnus, advinham reprimendas, excomunhões, maldições ou catastróficas profecias. Inúmeras registraram-se.
Do mar, onda gigantesca cobriria a Capital, alastrando-se pelos sertões.
Enorme baleia, dormitante nas profundezas da terra, acordaria e provocaria cataclismos. Vários locais tornar-se-iam camas do mamífero.
Cidades jaguaribanas seriam inundadas. Icó, onde se sentiu mal recebido, vaticinou transformar-se em porto de navios.
Na Rua Velha, distrito de Retiro, Itapajé, arruaceiros com cantigas libidinosas passaram onde se encontrava o missionário. Ele, logo, enxergou o diabo na corcunda de um. Amaldiçoou o logradouro, andou até a barragem de açude próximo e vaticinou: “O Retiro jamais vai passar de retiro.”.
Em Aracati, afora baleia, os presságios eram de que “gafanhotos de ferro haveriam de cruzar os ares” e “cavalos sem cabeça correndo nas ruas”.
Dada a desatenção sentida, por sina, a Quixeramobim profetizou submersão e leito do cetáceo.
Lendário faz-se que o quixeramobinense Antônio Vicente Mendes Maciel, o Antônio Conselheiro (1830-1897), ao afirmar que “O sertão vai virar mar e o mar virar sertão”, fundamentou-se em fado do clérigo.
*Geraldo Duarte é advogado, administrador e dicionarista.
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