Secretaria Municipal de Educação de Fortaleza cancela concurso literário
Quem escolhe a escrita como ofício sabe que, passado o enorme desafio de produzir um livro, resta a peleja para publicá-lo. Até o começo deste ano, a atriz e diretora teatral Juliana Carvalho achava que estava bem perto de superar essa segunda etapa e poderia, então, publicar seu primeiro título. Uma crítica literária sobre as mulheres na obra de Nelson Rodrigues, selecionada no Concurso Literário de Fortaleza, promovido pela Secretaria Municipal de Educação (SME) em parceria com a Secretaria de Cultura do município (Secultfor).
Lançado em abril do ano passado, o edital selecionou 30 obras literárias em quatro categorias. O prêmio Oliveira Paiva para obras de ficção em diversos gêneros (romance, conto, novela, peça teatral e literatura infantil); o Juvenal Galeno destinado à poesia, incluindo cordel; crônica contemplada pelo prêmio Ciro Colares e o Aloísio Medeiros, que englobava as produções de crítica artística e literária. Cada autor receberia R$ 5 mil líquidos (já descontados os impostos) pela produção, além da impressão e da publicação de mil exemplares (500 deles iriam para as bibliotecas da rede municipal de ensino) e uma verba de R$ 3 mil para coquetel de lançamento da obra classificada.
No entanto, mesmo com o empenho e a liquidação do prêmio de R$ 5 mil, realizado pela gestão passada antes do fim do mandato, Juliana e os outros escritores ficaram sem saber se receberiam o prêmio e, enfim, teriam seus livros publicados. Tudo porque, ao procurar a nova gestão da SME – que tocou as etapas do edital e faria os pagamentos, já que o recurso viria da pasta de Educação –, demoraram a ter uma resposta sobre o edital. “A gente tentou várias audiências com o secretário (Ivo Gomes). No primeiro mês, ele não estava recebendo ninguém, até que conseguimos falar com uma assessora dele”, conta Juliana.
Na reunião com a assessora, Márcia Campos, os autores foram informados de que o edital seria “ilegal” e por isso a Prefeitura não seguiria com os trâmites do concurso. Segundo o escritor Haroldo Serra Júnior, classificado na categoria ficção e que estava na reunião, os premiados tiveram a impressão de que eles tinham agido ilegalmente. “A gente argumentou que participou do edital pressupondo que era lícito, porque a Prefeitura é um órgão de fé pública. Por que a gente iria desconfiar que o edital teria alguma ilegalidade?”, disse. De acordo com ele, na ocasião, a SME não apresentou um parecer técnico explicando os erros no texto do edital. Outro ponto curioso, na opinião de Haroldo, é que o documento segue os moldes de outros concursos que ele já havia participado, como os da Secretaria da Cultura do Estado (Secult).
Sem publicação
Procurada por O POVO, a SME confirmou que foram encontradas diversas irregularidades no texto do edital, de composição da Secultfor, conforme informou a assessoria da pasta, e que, por isso, seria invalidado. A reportagem teve acesso ao parecer técnico da assessoria jurídica – o qual, segundo os escritores e a advogada Márcia Sucupira, que representa mais de metade dos autores, até ontem ainda não havia sido disponibilizado aos premiados. À época da reunião com os autores, em março, informou a secretaria, a avaliação não foi apresentada porque aguardava despacho de Ivo Gomes.
De acordo com o assessor jurídico da SME, David Duarte, há erros básicos como a não fundamentação do concurso pela lei federal número 8.666/93, de licitações e contratos administrativos. Além disso, de acordo com ele, “quando fala da seleção dos projetos, o edital deixa tudo a cargo da comissão julgadora e não cria nenhum requisito de avaliação. É totalmente subjetivo”. Outro problema estaria no item que trata do lançamento das obras. “O edital delega pros premiados que eles apresentem três orçamentos de impressão e lançamentos. Isso seria uma forma de dispensa de licitação às avessas”, explica ele.
Saiba mais
Procurada por O POVO, a Secretaria de Cultura de Fortaleza (Secultfor) informou, por meio de nota, que “o concurso literário de Fortaleza, edital 08/2012, foi lançado pela Secretaria Municipal de Educação – SME, cabendo à Secretaria de Cultura de Fortaleza apenas as funções de composição do edital e a indicação de servidores para participar da comissão de inscrição. Levantamos igualmente a informação de que tal acordo de cooperação não foi firmado oficialmente. Não havendo mais informações sobre o Edital na Secultfor.”
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