MERCADO, SENTIMENTOS E ILUSÕES
Fala-se em ditadura do mercado. Quem é o
tal mercado? É o conjunto de oportunidades de trocas, o encontro das demandas com
as ofertas. É a expressão da sociedade se manifestando conforma se organiza. O
reducionismo economicista, como os demais, limita e desvia a compreensão da
realidade. Mas a relevância da forma como as pessoas buscam os seus objetivos (demandas),
ajustando-os às oportunidades (ofertas) não explica tudo, mas revela aspectos
importantes.
Intelectuais atuam no mundo das ideias,
conforme Thomas Sowell, (1930 – vivo), na obra “Os intelectuais e a sociedade”.
São letrados, peritos ou escribas, segundo Raymond Aron (1905 – 1983), na obra
“O ópio dos intelectuais”. A posição do intelectual no mercado de profissões é
logo abaixo dos homens públicos de peso, como seus lugares-tenentes; são
instrumento de legitimação, mormente com a ascensão maligna do perito
(comunicólogos, politólogos e outros), conforme palavras de Carl Wright Mills
(1916 – 1962), na obra “A elite do poder”.
O mercado de trabalho dos intelectuais
guarda relação com diferentes formas de poder. No Brasil as interações dos
intelectuais com a política; o público para quem escreve; editoras e revistas
acadêmicas; departamentos de universidades; os seus pares foram abordadas, em
parte, por Sérgio Miceli Pessôa de Barros, na obra “Intelectuais e a classe
dirigente no Brasil: 1920 – 1945”; Pedro Demo (1941 – vivo), na obra
“Intelectuais e vivaldinos”; Edmundo Campos Coelho (1939 – 2001), na obra “Sinecura
acadêmica – a ética universitária em questão”; Leandro Augusto Marques Coelho Konder
(1936 – 2014), na obra “A derrota da dialética”; Luís Augusto Sarmento
Cavalcanti de Gusmão, na obra “O fetichismo do conceito”; Luiz Felipe de
Cerqueira e Silva Pondé (1962 – vivo) e suas publicações e vários outros.
As demandas dos intelectuais, na relação
com os seus pares, nos campi das
universidades, visam a publicação e venda de livros; publicar em revista
acadêmica; financiar pesquisa; ser citado por colegas, segundo Pondé. Escrevem
sobre o exótico como se fosse desafiador e original, mas é submissão à
tendência hegemônica. Alguns relatam mera coleta de depoimentos como se fosse tese.
Citam autores como argumento de autoridade, conforme Demo e Campos, nas
universidades que são marcadas pela endogamia.
A subjetividade da seleção dos programas
de pós-graduação; o personalismo do orientador nas relações com o orientando; a
confusão entre o recente e o inovador; o julgamento da bibliografia pela data
de publicação das obras; o credencialismo dos títulos acadêmicos nem sempre
correspondentes ao mérito; e a cômoda dialética negativa, que destrói ao modo
niilista, como assinala José Guilherme Merquior (1941 – 1991), na obra “Michel
Foucault ou niilismo de cátedra”. Emoções substituem a razão e os fatos, conforme
Pascal Bernardin (1960 – vivo), na obra “Maquiavel pedagogo” como parte do
mercado de teses, vagas nos programas de graduação, financiamento de pesquisa,
publicação de artigos em revistas acadêmicas. Não faltam condutas heterodoxas.
Vender ilusões, na forma de utopias, facilita tudo isso.
Universidades, porém, são arquipélagos
em que cada ilha tem uma cultura institucional diferente. Mercado é apresentado
pejorativamente, devendo ter a torpeza dos seus agentes ser controlada. O
mercado da política e o mercado intelectual nele contido, pretende exercer tal
controle. Políticos e intelectuais colocam-se como vestais, sacerdotisas de
Vesta, de pureza imaculada, candidatos a déspotas esclarecidos. Mas não são
piores nem melhores que o comum dos mortais. A política é um mercado como
qualquer outro, onde habitam os intelectuais engajados.
Fortaleza, 18/1/21.
Rui Martinho Rodrigues.
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