Na Hipocrisia do mundo você se descobre,
e, se encontra, quando vive um grande amor
Vicente Alencar

quinta-feira, 22 de outubro de 2020

O AFÃ DE JUSTIÇA Fortaleza, 19/10/20. Rui Martinho Rodrigues.

 

O AFÃ DE JUSTIÇA

Sociedade justa pode ser juízo analítico ou sintético (Immanuel Kant 1724 – 1824, na obra a “Crítica da razão pura”. No juízo analítico o predicado não ultrapassa a identidade do sujeito (ex: um triângulo tem três lados). No juízo sintético o predicado agrega atributo ao sujeito. Juízo analítico pode ser uma tautologia (repetição do sujeito no predicado, como um pneu é um pneu), pode ser uma caixa preta, deixando de explicitar atributos. Sociedade justa deve ser juízo sintético, desnudando os atributos que se pretende agregar ao conceito de sociedade. Igualdade e bem-estar são invocados.

Não se trata de problema específico, mas do conjunto das relações sociais, quando se fala em sociedade justa. Quanto maior a amplitude do objeto cognoscível, mais raso e conhecimento obtido pelo sujeito cognoscente (Imídeo Giuseppe Nérici, na obra “Introdução à lógica”). O conhecimento sobre um conjunto tão amplo de relações e situações não permite um conhecimento sólido (Friedrich August von Friedrich, 1899 – 1992). A ciência não respalda projeto de engenharia social.

Igualdade pode ser de todos em tudo, contrariamente ao pensamento de Nicolau Maquiavel (1469 – 1527), na obra “O príncipe”, que procurava a verdade pelo feito das coisas, ao invés de busca-las na imaginação, como coisa nunca vista. Pode ser de todos em algo (obedecer a sinal de trânsito); ou de alguns em tudo, como os reis filósofos da “A República” de Platão (428/427 a.C. – 348/347 a.C.), observadas nos regimes totalitários, como a “nomenclatura” dos regimes soviéticos e (Nilovam Djlas, 1911 – 1995, na obra “A nova classe”); pode ainda ser de alguns em algo, como direitos especiais para idosos. Estes sentidos de igualdade são omitidos (José D’Assunção Barros, 1957 – vivo, em “Igualdade e diferença”).

A pobreza comparada considera a diferença de renda desigualdade, ao invés de simples diferença. D’Assunção Barros faz a distinção entre estes conceitos. Desigualdade é injusta, desequipara cidadãos. Diferença é ser gordo ou magro, não afeta a cidadania. O ordenamento jurídico não distingue os cidadãos pela renda. Mas condições materiais diferentes repercutem na fruição dos direitos. Evitar que tal aconteça exige a igualdade de todos e a indiferenciação equivocada entre direitos (norma declaratória) e garantias (normas assecuratórias). Há quem invoque Direito Natural como garantias, erro de autores prestigiosos que tratam estes direitos como exigíveis na forma de obrigação de fazer. Mas eles são liberdades negativas, declaratórias, não assecuratórias.

A pobreza que interessa é a objetiva, medida por indicadores (mortalidade infantil, escolaridade, esperança de vida, bens de conforto por habitante) como tendência histórica. Mas tal abordagem impede o jogo entre vítima, vilão e salvador (análise transacional), dos estudos da troca de estímulo e resposta nas interações humanas (Eric Leonard Bernstein, 1910 – 1970, chamado Eric Berne). Mas o lado poético que faz prosélitos, vende livros e obtém aplausos não pode violar o mandamento do bardo Marcus Vinícius de Morais (1913 – 1980): “todo grande amor só é bem grande se for triste”. Falar na melhoria secular dos indicadores de pobreza objetiva não é vantajoso. É poético chorar a pobreza comparada crescente.

E os sacrifícios exigidos para a realização da “justiça”? Eric John Ernest Hobsbawm (1917 – 2012) “reconheceu erros” do regime soviético, sem os adjetivar, mas achou que a Revolução de 1917 proveitosa e o sacrifício justificável: sua ética era teleológica e superestimou os feitos soviéticos.

Fortaleza, 19/10/20.

Rui Martinho Rodrigues.

 

 

 

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