Cem
anos do poeta Adaucto Gondim
Soares
Feitosa*
A família me pede coisas
sobre o poeta Adaucto Gondim, Padra Branca 17.1.1915 – Fortaleza 12.9.1980.
Nisto é que vejo quão importante é a guarda de documentos, não em papel que
papeis somem, rasgam-se, tracejam-se, incendeiam-se. Sucessivas mudanças, casas
e apartamentos (a modernidade) e, pouco tempo, não resta folha. Antigamente as
pessoas pouco mudavam de lugar, exceto para arribar bem para longe (seca do 15
dentre outras), Amazonas e o nosso “pé que habita o mundo”. Então, quem aqui
ficava, ficava anos a fio no mesmo canto.
Eu mesmo, adolescente, em companhia
dele, revisitamos a casa tronco dos Soares Gondim, sítio Andresa, em Pedra
Branca. Somos parentes, sim, mas isto não tem a ver com o que lhes vou contar.
Adaucto é irmão de minha mãe, Anísia, filhos de José Soares Godinho, nascidos e
criados, um total de oito irmãos, na mesma casa, no mesmo sítio Andresa, em
Pedra Branca, do mesmo jeito que estava há 150 anos, hoje, tal e qual. Pois
fomos lá, eu, Adaucto e filha Nazária, mais de uma vez.
Já escrevi por aqui que,
sempre ligado às leituras, jamais revelei qualquer pender poético antes dos 50
anos. Isto me deixa absolutamente chateado, nestes meus 71 de agora em janeiro
deste 2015: Adaucto, o poeta mais próximo, jamais ter dialogado com ele em
poesia.
Uma amizade grande, amigos
mesmo, e não apenas tio e sobrinho, comecei a frequentar a casa dele (parente
pobre, vindo lá do interior, em companhia da mãe, abarrancando-se ambos, dias e
dias, na capital até a vassouras chiarem por detrás das portas). Não! Tenho
certeza que o tio e a tia não botavam vassouras contra nós. Pelo contrário, a
alegria da recepção e convívio. Uns treze anos, lembro-me das primeiras viagens
à capital, casa do parente e ilustre (rico, para os nossos padrões), desatavam-se
as redes bem cedo, tudo começava mais cedo naquele tempo, a azáfama das
crianças ao colégio; e já batia à porta, todos os dias, o poeta Otacílio de Azevedo.
E então, os dois, Adaucto e Otacílio, abriam a escaramuça poética de abrir o
dia por muitos dias, que Deus os tenha em Sua glória.
Evidente que eu ficava muito
encantado com aquilo tudo. Antero de Quental, Bilac, Cruz e Souza, etc, etc. Recitavam.
Pediam para eu ler o que haviam escrito de mais recente; tratavam-me, menino,
como um igual. Claro que, se possível, desempatava pelo tio... Levavam eles a
poesia muito a sério.
Depois, o tempo, os tempos. Tangíamos
outros assuntos quando frequentemente nos encontrávamos, Paracuru onde ele
tinha casa e passamos a ter também, e Fortaleza, ruas Major Facundo e Dona
Leopoldina. Nunca lhe externei — nem havia como, porque a vontade de escrever
era nenhuma — que eu também haveria de enveredar pela poesia. Distante, porém, acompanhava-lhe
os passos. A trova. Ele, Sinésio Cabral e César Coelho, apenas para mencionar
os falecidos que me foram próximos, faziam movimento. Os livros, pequenos, em
formato de trova, sempre me presenteava algum. Independentemente da parte que
me toca, muito bom poeta este meu finado tio.
O fato é que, editor do
Jornal de Poesia, tive o cuidado de coligir alguma coisa do poeta. Por fim, o
resgate em fac-símile do CEM TROVAS DE
TIRAR O CHAPEU. Está inteiro na página dele, nos livros de inteiro teor, do
Jornal de Poesia.
Mais não tem porque mais não
encontrei. Espero que, nestes cem anos do tio-poeta (assim o chamava),
encontremos mais coisas, inéditos, jornais. (Ele trabalhou a vida toda no
jornal Unitário, dos Diários Associados, ali, rua Senador Pompeu, quase esquina
com Guilherme Rocha.
Eis a ideia, meu caro leitor:
digitalizar tudo, guardar em papel, mas em meio digital também. É isto que
estou fazendo atualmente no Jornal de Poesia, projeto Livro de Inteiro Teor. Lustosa da Costa (Francisco José),
contemporâneo de Adaucto Gondim no mesmo jornal, falecido há uns três anos,
soube que os parentes procuram os livros dele para digitalizar. Tenho alguns
que já estou digitalizando.
Em suma, esta perda dupla:
nunca ter-me apresentado como poeta ao outro poeta, o tio-poeta, o que também
se deu em relação a outro parente não menos ilustre, o Padre Leitão. E, afinal,
a perda-perdida, estes cem anos, glória e morte de Adaucto Soares Godinho, o
Adaucto Gondim, que também se assinava Laurindo Fonseca nos escritos de jornal,
segunda fase de sua vida, em O Povo.
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