EDMILSON SANCHES
TRECHOS
Não bastassem as semelhanças geográficas e cronológicas, não bastassem as similitudes físicas e humanas, não bastassem essas coincidências espaciais, temporais e pessoais, registre-se mais outra: Gonçalves Dias, nascido em 1823, e Agostinho Noleto, nascido em 1943, têm em comum a origem nas terras denominadas Jatobá -- uma, caxiense; a outra, localidade carolinense.
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Como um bom romance, o livro conta também histórias de amor, homens valentes e mulheres apaixonadas. A história de Bento e Rosinha -- parecendo título de folheto de cordel --, o amor da moça Severa com o índio Kúcrit e até a ménage a trois do Negro Cosmo com Adelina e Almerinda. Em tudo isso a paixão, a trama, o drama. O sentimento e o ressentimento. A entrega e a refrega. A fala e a bala. Vida e morte. Memória, glória, história.
Discurso de Edmilson Sanches, presidente da Academia Imperatrizense de Letras, no lançamento do livro O Velho Jaborandy, de Agostinho Noleto (Teatro Ferreira Gullar, Imperatriz, Maranhão, 8 de julho de 2003).
Boa noite, Senhoras e Senhores.
Confrades Acadêmicos, boa noite.
Escritor Agostinho Noleto, meu vice-presidente e Autor que, em mais de 200 páginas, soube imprimir memória, história e glória destes rincões sul-maranhenses.
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O mês é julho. Estamos em uma das principais cidades do país. Um homem de estatura pequena, maranhense do interior, escritor competente, estudioso, dá a conhecer aos amigos e admiradores talvez a sua mais importante obra. Era julho de 1843 e, na cidade de Coimbra, em Portugal, Antônio Gonçalves Dias, maranhense de Caxias, dava à luz do mundo sua obra eterna “Canção do Exílio”.
Exatos 160 anos depois, um homem de estatura pequena, maranhense do interior, escritor competente, estudioso, dá a conhecer aos amigos e admiradores talvez a sua mais importante obra. É julho de 2003 e, na cidade de Imperatriz, uma das principais do País, 96ª maior do Brasil, Agostinho Noleto Soares, maranhense de Carolina, traz a lume talvez sua mais importante obra até aqui -- O Velho Jaborandy.
Não bastassem as semelhanças geográficas e cronológicas, não bastassem as similitudes físicas e humanas, não bastassem essas coincidências espaciais, temporais e pessoais, registre-se mais outra: Gonçalves Dias, nascido em 1823, e Agostinho Noleto, nascido em 1943, têm em comum a origem nas terras denominadas Jatobá -- uma, caxiense; a outra, localidade carolinense.
Portanto, Senhoras e Senhores, não é sem razão que a obra de Gonçalves Dias esteja tão incontidamente contida, reproduzida, e a cidade de Caxias mencionada, na obra de Agostinho Noleto, o livro O Velho Jaborandy, o primeiro grande romance histórico do Maranhão do Sul.
Essas citações, e excitações, devem de ter acontecido por modos e meios, artifícios e artimanhas do tal “Espírito das Letras”, entidade-personagem etérea à qual recorre e de que se socorre o velho personagem-título desta obra.
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Esta obra se realizou em duas noites. A primeira, a do personagem-título, que, numa longa conversa, fala tudo o que contém este livro. E a segunda noite, é a de hoje, de agora, onde Agostinho Noleto, misto de ouvidor e escrivão, escrevente e escritor, apresenta este seu relato-romance, bem escrito, bem impresso, bem apresentado.
Em um mar de 234 páginas navegam cerca de 20 personagens seniores, maiores, e mais ou menos 50 personagens juniores, intermediários ou menores, além de figuras da história e das menções a Gonçalves Dias, Platão, o professor Queiroz e o “Espírito das Letras”, que funcionam assim como referências de apoio, figuras-muletas, que dão amparo, suporte e estímulo ao prosseguimento da conversa do velho Jaborandy, desfiada toda ela em uma noite só, iluminada pelo luar do sertão. Embora haja um só narrador, a forma como conversa o velho pode ser definida -- oxímoro à parte -- como um monólogo a dois, tal o jeito envolvente do falante e sua recorrência às suas “muletas”, suas “entidades” de apoio.
Como um bom romance, o livro conta também histórias de amor, homens valentes e mulheres apaixonadas. A história de Bento e Rosinha -- parecendo título de folheto de cordel --, o amor da moça Severa com o índio Kúcrit e até a ménage a trois do Negro Cosmo com Adelina e Almerinda. Em tudo isso a paixão, a trama, o drama. O sentimento e o ressentimento. A entrega e a refrega. A fala e a bala. Vida e morte. Memória, glória, história.
Episódios como a fundação de Imperatriz (que mereceu um capítulo inteiro), o massacre de Alto Alegre, em Barra do Corda, o extermínio aos índios e o ritual da morte de um deles...; nomes como Garcia d’Ávila, Francisco Dias d’Ávila, Raimundo Noleto, Elias Barros, Francisco de Paula Ribeiro, Romão Acaroá, Sinhá Severa, Fulgêncio Rocha, João Rego, Zé Marrão, Militão Bandeira Barros, Leão Leda, frei Manoel Procópio, Daniel Félix do Rego, Antônio Moreira da Silva e Negro Cosmo são trabalhados e apropriados ora como personagens e fatos da realidade da vida, ora como elementos da realidade do romance.
A atmosfera de começo de formação deste sul do Maranhão é sentida pela descrição dos ambientes, das florestas, dos animais, dos modos e costumes de índios e não-índios. Do “A” de Acaroás ao “X” de Xavantes e Xerentes, desfilam diversas tribos indígenas, como os Capiekrans, os Kraôs, os Macamekrans, Piocobgês, Purekamecrans, Sacamekrans, Sapiekrans e, claro, os Timbiras.
A linguagem de Jaborandy, o velho, é própria daqueles homens de idade das pequenas comunidades. Instruído pela observação da vida, memória farta e fértil, o velho Jaborandy fala numa linguagem fácil, marcada aqui e acolá por alguns rasgos de alto letramento e sofisticação e pontuada, sempre, pela deliciosa dicção do falar caboclo, com palavras e expressões bem próprias do interior das pequenas cidades e da grandeza das vidas que nelas habitam. Assim, o velho Jaborandy vai falando gostoso com termos como “derna” (corruptela de “desde”) e “malenconia” (melancolia) e apoiando-se naturalmente em expressões como “espia só” e, sobretudo, “Ah pois” e “Qual o quê”.
Senhoras e Senhores:
Aí estão alguns registros e impressões deste terceiro livro de Agostinho Noleto.
Em 2005, daqui a menos de dois anos, a história do sul do Maranhão vai completar 170 anos de intenções e ações por um novo estado -- o Maranhão do Sul. E que bom que uma nova unidade da federação nasça com a consistência de registros histórico-literários como o que esta noite Agostinho Noleto lança para os sul-maranhenses. Neste livro, vai-se de 29 de março de 1549 até o século 20, um arco de tempo de quase meio milênio sobre antecedentes, correlatos e conseqüentes de pessoas, coisas e fatos.
Com 151 anos de fundação, mas apenas 30 anos de história bibliográfica, Imperatriz continua surpreendendo: desde quando foi publicado o primeiro livro imperatrizense, em 1972, a média de publicações de livros confirma que, há trinta anos, praticamente todo mês imprime-se um novo título, publica-se uma nova obra, lança-se um novo livro. E mais, muito mais, já teria sido lançado, houvesse o necessário, e sempre insuficiente, apoio. Ainda assim -- e o livro de Agostinho Noleto o confirma -- não falta a Imperatriz escritores e obras de qualidade. O que falta é leitores, de preferência em quantidade, em grande quantidade.
Parabéns ao sul do Maranhão, que com esta obra ganha sua certidão de nascimento.
Parabéns, Agostinho, aqui rodeado por sua orgulhosa esposa Socorro e seus orgulhosos filhos, noras e netos, estes residentes em Brasília, onde juntaram forças e esforços para realizar a edição e impressão desta obra, neste ano da graça de 2003, quando Agostinho Noleto Soares entra, como ele mesmo define, na “flor da velhice”, ou, como eu digo, no início de sua juventude sessentã.
Ao Agostinho: continue trabalhador. Continue produtivo. Continue amigo.
Sobretudo, continue feliz.
Nossas palmas são para você.
EDMILSON SANCHES
edmilsonsanches@uol.com.br
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