Mentiras petralhas nos comentários - 1
"Falar mentiras é diferente de ter uma opinião".
Reinaldo Azevedo, 26 de novembro de 2011.
Schopenhauer, ao elencar algumas estratégias que costumam ser usadas para vencer um debate por qualquer meio, lícito ou ilícito, avisava que os raciocínios errôneos eram fáceis de explicar e de entender, ao passo que as ideias corretas exigiam muito mais tempo e paciência para serem expostas e compreendidas. Daí a tendência das plateias se entusiasmarem com a ideia equivocada e cochilarem enquanto o debatedor a corrige
Bem, ele poderia ter acrescentado que o mesmo vale quando se conta uma mentira: afirma-se que "A é B" mesmo quando não é, cabendo ao outro, se quiser ser rigoroso na resposta, tecer uma explicação para provar que não é e nem pode ser. E, se tivesse vivido na era da internet, o filósofo poderia ainda acrescentar que esse é o veículo ideal para a propagação de mentiras: em cinco linhas de comentário a um texto longo, um sujeito anônimo manda ver meia dúzia de mentiras descaradas, e o autor do texto tem de optar se deixa de publicá-las, já que só prestam para desinformar, ou se as publica para ser fiel ao espírito da democracia e do debate de ideias, mesmo sabendo que vai ter de gastar mais tempo que o comentador para dar resposta.
É exatamente nessa posição que me encontro agora. Um comentário enviado para o postRelembrando o "modelo econômico" que era "contra tudo isso que está aí" despeja tantas mentiras em poucas linhas que responder a todas elas exigiria um texto longo demais para uma blog. Sendo assim, vou responder ao comentário por partes, começando pelas primeiras linhas, conforme segue:
Diferença: O FHC não criou uma política de emprego, e no governo Lula chegamos ao pleno emprego [...]
Para quem viveu os anos 90, ou leu a respeito, a afirmação acima falseia a história já pelo fato de omitir o debate econômico travado durante o segundo governo FHC. Naquele tempo, políticos e acadêmicos petistas afirmavam que a política macroeconômica era "neoliberal" por estar baseada em metas de inflação e de superávit primário, sendo, portanto, incapaz de gerar postos de trabalho em número suficiente para contemplar o crescimento da População Economicamente Ativa - PEA. Daí a conclusão de que seria preciso mudar a política econômica para dar ao Estado uma capacidade de investimento compatível com esse objetivo.
Ora, mas a política econômica dos dois mandatos de Lula foi a mesma do segundo governo FHC, conforme eu afirmei no post acima citado! Sendo assim, está muito claro que, se o comentário afirma que Lula foi melhor por ter implementado uma "política de emprego", acaba por reconhecer que o PT e seus intelectuais acólitos enganaram os eleitores quando disseram que era preciso mudar a política econômica para poder executar políticas desse tipo!
Fora isso, é mentira que o governo anterior ao de Lula não se preocupou com a questão. Nos anos FHC, tivemos o Planfor - Plano Nacional de Qualificação do Trabalhador, o qual Lula substituiu pelo PNQ - Programa Nacional de Qualificação Social e Profissional, que fazia parte do PPA 2004-2007. O problema é que esse segundo programa, sob o ponto de vista crítico do "neoliberalismo", não trouxe nenhuma mudança qualitativa que justifique atribuir a ele a queda das taxas de desemprego - que, aliás, permaneceram altas durante a maior parte do governo Lula. Ver a respeito a dissertação de Patricia E. Peixoto, que tem a honestidade de reconhecer que os dois governos não diferem nesse setor (aqui).
Finalmente, cabe dizer que desemprego baixo só é realmente bom quando resulta de crescimento econômico acelerado, mas o que temos hoje é uma taxa de desemprego baixa em meio ao crescimento mais fraco dos últimos 60 anos! Isso significa que o desemprego está sendo contido em virtude da geração de postos de trabalho de baixa produtividade, o que lança perspectivas negativas para o desempenho futuro da economia, já que este depende, sobretudo no longo prazo, da elevação da produtividade. E a grande ironia disso é que o PNQ foi instituído por Lula para capacitar os trabalhadores a obter empregos de mais alta produtividade e salários mais elevados, mas o que se vê hoje é que as ocupações que mantém o desemprego baixo são aquelas que, por serem de baixa produtividade, não exigem qualificação...
Quanto é preciso escrever para desmontar as mentiras embutidas em duas linhas! Mas eu ainda vou desmontar as outras mentiras em futuras postagens. Não falha!
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