RESÍDUOS E DERIVAÇÕES
Vilfredo Pareto (1848 – 1923) analisou
raciocínios e condutas, tipificando-as como resíduos e derivações, decorrentes
dos sentimentos e pseudorraciocínios. O autor citado distinguiu seis categorias
de resíduos e derivações: instintos de combinações ou raciocínios; persistência
dos agregados supostamente lógicos; conservação dos agregados por desejo de
manter as referências cognitivas; resíduos decorrentes da sociabilidade;
integridade do indivíduo e de seus dependentes; resíduos sexuais.
O tema da igualdade está eivado de
resíduos e derivações. São resíduos a persistência de ideias iluministas e da
Revolução Industrial sobre a natureza humana, segundo as quais todos têm uma
mesma natureza humana e portanto são iguais. É um resíduo bem fundamentado. Segue-se
uma derivação: tendo a mesma natureza temos a mesma essência. Logo, somos
iguais (social e economicamente?).
Partimos do razoável, agregamos uma
derivação falaciosa e sacralizamos o igualitarismo. A igualdade essencial é ontológica.
A condição social e econômica fenomênica, é o observável, é o que se nos apresenta.
Não afeta a essencia do ser. É mero acidente, integra a realidade mas não afeta
a essencia. É como não ter uma perna. Não afasta a essência humana. Diferenças
sociais e econômicas são acidentes, não essência.
Resta saber se afetam a dignidade da
pessoa. Atingem se injustas, opressivas ou lesionam a reputação. Aceitar que
diferenças econômicas e sociais ferem a dignidade da pessoa é aceitar que
pobreza comparada fere reputação. A pobreza a ser combatida deveria ser aquela
de caráter objetivo ou absoluto, que pode ser expressa pelos indicadores de
qualidade de vida, tais como mortalidade infantil, esperança de vida ao nascer,
analfabetismo, anos médios de escolaridade, acesso aos bens materiais tais como
eletrodomésticos, automóveis etc.
Além dos resíduos dos
tempos da Revolução Industrial e mais antigos, temos a necessidade de
manisfestar sentimentos. “Meu espelho fiel, quem é mais virtuoso do que eu, que
defendo a igualdade”? Resíduos relacionados com a sociabilidade também estão
presentes. Não protestar contra a desigualdade será considerado ignorância ou
maldade. Não se trata, pensam, de alguém que conhece e sabe exercer a crítica do
igualitarismo de autores famosos. Trará indisposição com amigos, colegas e
parentes, conflita com o discurso dominante. A integridade do indivíduo e seus
dependentes, também favorece a falácia igualitária. Desafiar o igualitarismo
dificulta o acesso aos mestrados, doutorados, concursos, bolsas de pesquisa,
publicação em revista acadêmica e divulgação de livros. Até os resíduos sexuais
entram em cena. Não aceitar o igualitarismo poderá afastar parcerias, podendo
fechar portas ao carreirismo, a exemplo de partilha do leito e drogas lícitas e
ilícitas.
Derivações pseudológicas estabelecem
relação entre a dignidade e a igualdade fenomênica. Mas a dignidade não é
lesionada se a pessoa não acessar bens luxuosos. A série histórica dos
indicadores de qualidade de vida apresentam tendência secular para melhorar,
recuperando o recuo das recessões, enquanto o igualitarismo exclui o direito de
se diferenciar e a competição, desconsiderando o mérito (Ronald Dworin, 1931 –
2013; e John Rawls, 1921 – 2002).
Igualdade e diferença
são coisas diversas (José Dássunção Barros, 1967 – vivo) é desprezada. A
primeira é injusta, opressiva, afeta o bom nome, desconsidera a igualdade
ontológica, coisas que dizem respeito a dignidade da pessoa. A segunda diz
respeito aos aspectos acidentais, como os econômicos e sociais. Somente quando
impeçam algum direito público subjetivo haverá opressão. Chegamos aos serviços
essenciais, como saúde e educação, ou igualdade de oportunidades, diversa da
igualdade de resultados.
Fortaleza, 29/10/19.
Rui Martinho Rodrigues.
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