O pensamento socialista tornou-se
hegemônico. Até os seus críticos se impregnaram com as suas teses. Defende a
igualdade sem distinção de mérito, o bem-estar sem necessidade de esforço e a
justiça, cujo entendimento polêmico nem sempre é captado pelos seus admiradores.
Os nossos Fracassos e culpas imputamos à sociedade. Rousseau (1712 – 1778)
expressou esta absolvição universal dizendo que o homem nasce bom e a sociedade
o corrompe. Não disse, porém, quem corrompeu a sociedade. Podemos ser virtuosos
sem fazer o bem, considerado assistencialismo desprezível. A luta é por “um
mundo melhor”, que se faz apontando e castigando culpados, sem o ônus de
socorrer necessitados, mas pela mudança das estruturas sociais.
Somos virtuosos e sábios. “Sabemos o que
está por trás das aparências”; temos a ambição de poder “só para fazer justiça”;
os nossos fracassos e crimes são culpa da sociedade. Temos a quem odiar e jogar
todas as responsabilidades: o “sistema”. Podemos ser incoerentes: a dialética
nos socorre com a unidade dos contrários. Somos pela cultura da paz e financiamos
o crime violento comprando e usando drogas ilícitas. Somos internacionalistas
ou nacionalistas conforme a conveniência da luta pelo poder. Desqualificamos os
nossos críticos como “serviçais dos opressores”. Escapamos da crítica porque
somos do “lado do bem”. Os nossos críticos são “do mal”. Fazemos pose de
intelectual porque temos a companhia de quase todos eles nas posições que assumimos
ou até somos um deles.
Prometemos emancipação. Obediências só às
normas em cuja elaboração participamos. Desfrutamos da solidariedade de irmãos
de fé, digo, de camaradas ou companheiros. Transcendemos a nossa finitude sendo
parte de um todo orgânico que pode ser a classe social, um partido ou um
movimento político. Não precisamos de família, igreja ou pátria. Estas até
atrapalham, principalmente as duas primeiras, com as quais convivemos de perto,
exigindo de nós o exercício da tolerância. Seguimos a deusa Bem-Aventurança pela
estrada macia que leva ao bem-estar assegurado pelo Papai Noel, digo, pelo Estado.
Bem-estar não precisa ser conquistado. Não pensamos em esforço nem no campo
intelectual. Seguimos comodamente o pensamento hegemônico. Citamos autores que
não lemos, repetimos chavões e odiamos as injustiças sociais. Simples assim. Não
há sedução maior.
Intelectuais são românticos como os poeta
são mentirosos. Quem vende livro, escreve roteiro de filme ou novela e quer
aplauso precisa seduzir, explorar emoções, vender fantasia. Engenheiros
nucleares e físicos geniais e estudiosos não são intelectuais. Poetas e
teóricos da cultura é que são assim qualificados. Os modernos meios de
comunicação difundiram as fantasias dos românticos havidos como sábios.
Chegamos ao declínio do dever, à cultura do Direito sem obrigação (LIPOVETSKY,
Giles. A sociedade pós-moralista. O crepúsculo do dever e a ética indolor dos
novos tempos democráticos. Barueri: Manole, 2005).
Todos os partidos têm
programas com forte influência socialista, configurando um monopartidarismo
discreto. Todos os erários, por outro lado, estão endividados. A solução
pretende-se que seja indolor. Até as igrejas têm sido influenciadas pelo
projeto análogo à Torre de Babel (OAKESHOTT, Michael. Sobre a História. Rio de
Janeiro: Topbooks2003), que consiste em chegar ao céu sem precisar morrer,
esquecidas de que após a queda o homem foi expulso do Éden o Senhor colocou
dois querubins armados de espada flamejante na porta do Paraíso para que o
homem não volte a desfrutar dele sem precisar morrer. A França do pós-guerra
muito contribuiu para tal hegemonia ideológica. Mas igrejas e influência
francesa são temas para outras reflexões.
Fortaleza, 20 de
dezembro de 2017
Rui
Martinho Rodrigues
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