quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013
Jornalista faz desagravo a Paulo Freire e acaba me dando razão!
Saiu na Gazeta do Povo um artigo meu com
críticas à Paulo Freire (ver aqui),
o qual é uma versão resumida do post Paulo
Freire fazia "educação bancária" ideologizada(*). Um agrônomo e jornalista
profissional chamado Valdir Izidoro Silveira resolveu então fazer um "desagravo"
a esse autor, e escreveu um texto que merece minha resposta por demonstrar muito
bem a desonestidade e fragilidade dos argumentos usados pelos admiradores de
Freire.
O texto completo dele está aqui.
Começa de maneira enfadonha, apresentando um currículo de Paulo Freire. É o
manjado argumento de autoridade, pois consiste em sugerir que, se o sujeito
ocupou este e aquele cargo, se deu aula nesta e naquela instituição, o que ele
escreveu só pode estar correto ou, no mínimo, deve ser discutido como se fosse
um pensamento complexo e bem fundamentado. Ocorre que eu fiz uma citação de
Freire para mostrar que o pensamento social dele era simplório e argumentei que
o diálogo freiriano não passa de manipulação. Fiz isso ao explicar como
funciona, em termos práticos, a suposta "construção conjunta" de conhecimentos
proposta pelos freirianos, conforme repito abaixo:
[...] o professor questiona os alunos sobre o
seu dia a dia, apresenta uma explicação ideológica para os problemas e
insatisfações relatados, e depois discute com eles o que acharam desse conteúdo.
Se os alunos discordarem da explicação, o professor argumenta em favor do seu
próprio ponto de vista ideológico. Ao fim do diálogo, o professor conclui que os
alunos que ele conseguiu convencer estão agora “conscientes” da sua “verdadeira”
condição de oprimidos e explorados pela sociedade de classes.
Ora, isso é apenas a dita “educação bancária”
camuflada de diálogo! O professor apresenta uma única via para explicar as
situações relatadas pelos alunos: a ideologia em que ele acredita. O aluno é
deixado na ignorância sobre a existência de pesquisas que explicam as situações
de pobreza, desigualdade, problemas urbanos e ambientais, entre outros, fora do
universo teórico e ideológico do professor.
Valdir Silveira não mencionou absolutamente
nada sobre essa caracterização que fiz do diálogo freiriano e, após a
apresentação do currículo, afirma que a educação é sempre ideológica mesmo, como
Freire defendia.
É, Paulo Freire sempre se agarrava a essa
conversa de que toda educação é necessariamente ideológica para sugerir que,
sendo assim, cada professor deve mesmo vender o seu peixe para os alunos.
Contudo, essa concepção equivocada de educação é a maior prova de que, no
diálogo proposto por ele, não existe "construção conjunta de conhecimentos"
coisíssima nenhuma, mas apenas um processo de doutrinação em que o professor
transmite as suas ideologias para os alunos usando exemplos de problemas
cotidianos relatados por eles como supostas demonstrações de que tais ideologias
são a verdade. Trata-se de uma contradição em termos, pois toda construção de
conhecimentos tem de partir do pressuposto de que a explicação dos fenômenos
ainda é incerta antes de ser investigada com métodos rigorosos, ao passo que
Freire começava o diálogo com os alunos imbuído da crença de que as ideologias a
serem transmitidas eram verdades das quais os alunos tinham de ser
"conscientizados"!
Em vez de argumentos,
desqualificação
Depois do argumento de autoridade e de repetir
um velho chavão freiriano, Silveira escreve:
[...] afirmar que o método
Paulo Freire "sonega ao aluno o conhecimento de explicações alternativas e mais
sofisticadas do que aquela" é de uma má fé e intenção - para não dizer safadeza
intelectual - à toda a prova.
Para demonstrar que houve má fé na minha
crítica, Silveira deveria ter apresentado exemplos concretos de que os
professores freirianos ensinam modos diferentes de explicar a realidade social
para que os alunos possam avaliá-las por si mesmos. Como ele não fez isso, fica
claro que me chamou de mentiroso sem demonstrar onde estava a mentira, o que é
desqualificação moral gratuita.
Logo em seguida, ele pergunta o
seguinte:
[...] de que conhecimento
"mais sofisticado" fala o professor Diniz?
Em meu artigo, fiz uma citação de Paulo Freire
sobre as causas do desemprego para dar um exemplo de como ele tinha uma visão
social simplória e maniqueista. Se Valdir Silveira pergunta de que outro
conhecimento eu poderia estar falando, é sinal de que, assim como Freire, não
conhece nenhuma explicação para esse fenômeno que não sejam palavras de ordem do
tipo "é tudo culpa das elites"!
Então, já que ele não conhece nenhuma
explicação mais sofisticada do que essa, apresento a do economista José Pastore
como um exemplo. Segundo esse autor, as taxas de desemprego são fortemente
afetadas pela interação de três variáveis, que são o aumento da produtividade do
trabalho, a legislação trabalhista e a qualificação da mão de obra. Quando as
leis trabalhistas são flexíveis e a mão de obra é bem qualificada, a
modernização tecnológica gera mais empregos do que elimina, além de substituir
empregos de menor produtividade e remuneração mais baixa por empregos melhores.
Já nos países onde a mão de obra é pouco qualificada e/ou a legislação
trabalhista é muito restritiva, os ganhos de produtividade destroem mais
empregos do que criam. E o autor procura provar isso citando as taxas de
desemprego de vários países.
Essa não é uma explicação muito mais
sofisticada do que aquela baboseira do Paulo Freire sobre a "gulodice" das
elites? Além disso, é uma explicação cuja validade pode ser testada
independentemente de juízos ideológicos, isto é, por meio de pesquisas
comparativas documentais sobre legislação e do uso de indicadores de
produtividade do trabalho e de níveis de qualificação. Depois falam que
pesquisa científica e ensino são só ideologias com outros nomes...
O essencial, porém, é destacar que um aluno que
tivesse aulas com um professor freiriano sobre o desemprego jamais poderia usar
argumentos como esses para contestar os "novos saberes", ou melhor, as
ideologias que esse professor lhe apresentou. Afinal, só quem lê trabalhos de
economia pode pensar em uma explicação assim, mas o suposto "método Paulo
Freire" era aplicado com analfabetos!
No final, a franqueza
reveladora
Na conclusão do seu post, Silveira mostra, sem
disfarçar, que é a favor de doutrinar os alunos mesmo!
O ensino, a educação, não
precisa de sofisticação, sim de uma pedagogia que leve ao aprendizado crítico e
contestador da realidade. O resto, o resto professor Diniz "são tertulhas
flácidas para ninar bovinos", no bom portugues "conversa mole pra boi dormir".
O que os freirianos chamam de pensamento
"crítico e contestador" são as ideologias anticapitalistas toscas em que eles
acreditam. Logo, ele está dizendo que o aluno tem de ser levado a acreditar que
essas ideologias são representações fieis da realidade, e ponto final. Visões
alternativas, trabalhos científicos, estudos baseados em estatísticas... toda
essa sofisticação é "conversa pra boi dormir". E Silveira resolveu ser franco
desse jeito logo depois de escrever que eu minto em minha acusação de que os
freirianos mostram uma única visão da realidade aos seus alunos. Essa
incoerência flagrante, que toca as raias da hipocrisia, é que merece ser chamada
de "safadeza intelectual"!
Concluindo, o texto dele só comprova que os
freirianos não ensinam explicações alternativas para os alunos, e isso por dois
motivos: primeiro, porque a pluralidade de conteúdos impediria a manipulação do
processo dialógico da forma mais simples e eficiente para a doutrinação, que é
ficar o tempo todo confrontando o senso comum de alunos iletrados com as
ideologias simplistas que lhes são apresentadas; segundo, porque os professores
freirianos, assim como seu mestre, ignoram as pesquisas que põem em xeque as
ideologias nas quais eles creem. Não ensinam para poderem manipular melhor os
alunos e também por não saberem mesmo!
(*) Agradeço a Miguel
Nagib, coordenador do site Escola Sem Partido, por haver feito o resumo do
post.
Saiu na Gazeta do Povo um artigo meu com
críticas à Paulo Freire (ver aqui),
o qual é uma versão resumida do post Paulo
Freire fazia "educação bancária" ideologizada(*). Um agrônomo e jornalista
profissional chamado Valdir Izidoro Silveira resolveu então fazer um "desagravo"
a esse autor, e escreveu um texto que merece minha resposta por demonstrar muito
bem a desonestidade e fragilidade dos argumentos usados pelos admiradores de
Freire.
O texto completo dele está aqui.
Começa de maneira enfadonha, apresentando um currículo de Paulo Freire. É o
manjado argumento de autoridade, pois consiste em sugerir que, se o sujeito
ocupou este e aquele cargo, se deu aula nesta e naquela instituição, o que ele
escreveu só pode estar correto ou, no mínimo, deve ser discutido como se fosse
um pensamento complexo e bem fundamentado. Ocorre que eu fiz uma citação de
Freire para mostrar que o pensamento social dele era simplório e argumentei que
o diálogo freiriano não passa de manipulação. Fiz isso ao explicar como
funciona, em termos práticos, a suposta "construção conjunta" de conhecimentos
proposta pelos freirianos, conforme repito abaixo:
[...] o professor questiona os alunos sobre o seu dia a dia, apresenta uma explicação ideológica para os problemas e insatisfações relatados, e depois discute com eles o que acharam desse conteúdo. Se os alunos discordarem da explicação, o professor argumenta em favor do seu próprio ponto de vista ideológico. Ao fim do diálogo, o professor conclui que os alunos que ele conseguiu convencer estão agora “conscientes” da sua “verdadeira” condição de oprimidos e explorados pela sociedade de classes.Ora, isso é apenas a dita “educação bancária” camuflada de diálogo! O professor apresenta uma única via para explicar as situações relatadas pelos alunos: a ideologia em que ele acredita. O aluno é deixado na ignorância sobre a existência de pesquisas que explicam as situações de pobreza, desigualdade, problemas urbanos e ambientais, entre outros, fora do universo teórico e ideológico do professor.
Valdir Silveira não mencionou absolutamente
nada sobre essa caracterização que fiz do diálogo freiriano e, após a
apresentação do currículo, afirma que a educação é sempre ideológica mesmo, como
Freire defendia.
É, Paulo Freire sempre se agarrava a essa
conversa de que toda educação é necessariamente ideológica para sugerir que,
sendo assim, cada professor deve mesmo vender o seu peixe para os alunos.
Contudo, essa concepção equivocada de educação é a maior prova de que, no
diálogo proposto por ele, não existe "construção conjunta de conhecimentos"
coisíssima nenhuma, mas apenas um processo de doutrinação em que o professor
transmite as suas ideologias para os alunos usando exemplos de problemas
cotidianos relatados por eles como supostas demonstrações de que tais ideologias
são a verdade. Trata-se de uma contradição em termos, pois toda construção de
conhecimentos tem de partir do pressuposto de que a explicação dos fenômenos
ainda é incerta antes de ser investigada com métodos rigorosos, ao passo que
Freire começava o diálogo com os alunos imbuído da crença de que as ideologias a
serem transmitidas eram verdades das quais os alunos tinham de ser
"conscientizados"!
Em vez de argumentos,
desqualificação
Depois do argumento de autoridade e de repetir
um velho chavão freiriano, Silveira escreve:
[...] afirmar que o método Paulo Freire "sonega ao aluno o conhecimento de explicações alternativas e mais sofisticadas do que aquela" é de uma má fé e intenção - para não dizer safadeza intelectual - à toda a prova.
Para demonstrar que houve má fé na minha
crítica, Silveira deveria ter apresentado exemplos concretos de que os
professores freirianos ensinam modos diferentes de explicar a realidade social
para que os alunos possam avaliá-las por si mesmos. Como ele não fez isso, fica
claro que me chamou de mentiroso sem demonstrar onde estava a mentira, o que é
desqualificação moral gratuita.
Logo em seguida, ele pergunta o
seguinte:
[...] de que conhecimento "mais sofisticado" fala o professor Diniz?
Em meu artigo, fiz uma citação de Paulo Freire
sobre as causas do desemprego para dar um exemplo de como ele tinha uma visão
social simplória e maniqueista. Se Valdir Silveira pergunta de que outro
conhecimento eu poderia estar falando, é sinal de que, assim como Freire, não
conhece nenhuma explicação para esse fenômeno que não sejam palavras de ordem do
tipo "é tudo culpa das elites"!
Então, já que ele não conhece nenhuma
explicação mais sofisticada do que essa, apresento a do economista José Pastore
como um exemplo. Segundo esse autor, as taxas de desemprego são fortemente
afetadas pela interação de três variáveis, que são o aumento da produtividade do
trabalho, a legislação trabalhista e a qualificação da mão de obra. Quando as
leis trabalhistas são flexíveis e a mão de obra é bem qualificada, a
modernização tecnológica gera mais empregos do que elimina, além de substituir
empregos de menor produtividade e remuneração mais baixa por empregos melhores.
Já nos países onde a mão de obra é pouco qualificada e/ou a legislação
trabalhista é muito restritiva, os ganhos de produtividade destroem mais
empregos do que criam. E o autor procura provar isso citando as taxas de
desemprego de vários países.
Essa não é uma explicação muito mais
sofisticada do que aquela baboseira do Paulo Freire sobre a "gulodice" das
elites? Além disso, é uma explicação cuja validade pode ser testada
independentemente de juízos ideológicos, isto é, por meio de pesquisas
comparativas documentais sobre legislação e do uso de indicadores de
produtividade do trabalho e de níveis de qualificação. Depois falam que
pesquisa científica e ensino são só ideologias com outros nomes...
O essencial, porém, é destacar que um aluno que
tivesse aulas com um professor freiriano sobre o desemprego jamais poderia usar
argumentos como esses para contestar os "novos saberes", ou melhor, as
ideologias que esse professor lhe apresentou. Afinal, só quem lê trabalhos de
economia pode pensar em uma explicação assim, mas o suposto "método Paulo
Freire" era aplicado com analfabetos!
No final, a franqueza
reveladora
Na conclusão do seu post, Silveira mostra, sem
disfarçar, que é a favor de doutrinar os alunos mesmo!
O ensino, a educação, não precisa de sofisticação, sim de uma pedagogia que leve ao aprendizado crítico e contestador da realidade. O resto, o resto professor Diniz "são tertulhas flácidas para ninar bovinos", no bom portugues "conversa mole pra boi dormir".
O que os freirianos chamam de pensamento
"crítico e contestador" são as ideologias anticapitalistas toscas em que eles
acreditam. Logo, ele está dizendo que o aluno tem de ser levado a acreditar que
essas ideologias são representações fieis da realidade, e ponto final. Visões
alternativas, trabalhos científicos, estudos baseados em estatísticas... toda
essa sofisticação é "conversa pra boi dormir". E Silveira resolveu ser franco
desse jeito logo depois de escrever que eu minto em minha acusação de que os
freirianos mostram uma única visão da realidade aos seus alunos. Essa
incoerência flagrante, que toca as raias da hipocrisia, é que merece ser chamada
de "safadeza intelectual"!
Concluindo, o texto dele só comprova que os
freirianos não ensinam explicações alternativas para os alunos, e isso por dois
motivos: primeiro, porque a pluralidade de conteúdos impediria a manipulação do
processo dialógico da forma mais simples e eficiente para a doutrinação, que é
ficar o tempo todo confrontando o senso comum de alunos iletrados com as
ideologias simplistas que lhes são apresentadas; segundo, porque os professores
freirianos, assim como seu mestre, ignoram as pesquisas que põem em xeque as
ideologias nas quais eles creem. Não ensinam para poderem manipular melhor os
alunos e também por não saberem mesmo!
(*) Agradeço a Miguel
Nagib, coordenador do site Escola Sem Partido, por haver feito o resumo do
post.