Na Hipocrisia do mundo você se descobre,
e, se encontra, quando vive um grande amor
Vicente Alencar

quinta-feira, 1 de outubro de 2020

A NOVA ROUPAGEM DO COLONIALISMO Fortaleza, 30/9/20. Rui Martinho Rodrigues.

 A NOVA ROUPAGEM DO COLONIALISMO

Os gregos concebiam a marcha da humanidade como um eterno retorno.

Salomão (990 a.C. – 930 a. C.) disse que “o que foi tornará a ser, o que foi feito se fará

novamente; não há nada de novo sob o sol”. A história militar ressalta o uso das

mesmas rotas de invasão em sucessivas guerras. O exemplo mais conhecido é a

passagem pela Bélgica, nas duas guerras mundiais, do exército alemão rumo a França.

Agostinho de Hipona (354 – 430) concebeu a sucessão de acontecimentos históricos

como uma marcha evolutiva com um epílogo triunfal na forma da cidade de Deus. Karl

Heinrich Marx (1818 – 1883), na obra “O 18 de Brumário de Luís Bonaparte”,

expressou um entendimento diferente: disse que a história não se repete, exceto como

tragédia ou como farsa.


A história como sucessão de fatos (terremotos, secas) e atos (conduta

humana), e como interpretação dos nexos e desdobramentos dos ditos atos e fatos,

conforme José Honório Rodrigues (1913 – 1987), na obra “Teoria da História do

Brasil”, certamente ensejam e constituem, respectivamente, narrativas comparáveis às

diversas espécies do gênero drama (tragédia, comédia, farsa, auto); ou do gênero épico,

que celebra feitos memoráveis em forma de poema, romance ou novela. Permitam-me

explicar. Certas circunstâncias dificultam a compreensão até do óbvio. Gêneros são

conjuntos que reúnem diferentes espécies agregadas por algum aspecto comum. O

colonialismo foi apresentado como “O fardo do homem branco”, título do poema de

Rudyard Kipling (1865 – 1936), no qual o autor apresenta a “missão civilizadora” do

imperialismo e adverte sobre os custos do empreendimento, ao tratar da conquista das

Filipinas, que os EUA tomaram dos espanhóis.


O neocolonialismo pode ser descrito pelas várias espécies dos gêneros

drama e épico. A “missão civilizadora” assume a forma de salvação do planeta. Mais

urgente do que civilizar é evitar a extinção da vida. A discussão sobre florestas, oceanos

e indústrias é a nova versão do colonialismo. A indústria encontra-se, em sua maioria,

na Ásia: China, Japão, Índia, Coreia do Sul. Agregando-se à indústria asiática as

fábricas ocidentais do hemisfério norte, EUA, Rússia, Alemanha e outros temos quase

toda a produção industrial do mundo. Mas a “preocupação” é com o Brasil. Vegetais

podem gerar um pequeno saldo positivo na produção de oxigênio, comparado ao

dióxido de carbono que produzem em todo o planeta. Os grandes incêndios em todo o

mundo deveriam preocupar, mas o hemisfério norte não é alvo da missão civilizadora.


Oceanos, fonte principal do oxigênio, deveriam preocupar mais do que florestas, mas

não são território a ser “salvo pela missão civilizadora”.


De repente, não mais que de repente (Marcus Vinicius de Morais, 1913 –

1980), o Brasil é o novo “fardo do homem branco” empenhado em salvar Amazônia,

por coincidência rica em minérios. É mais barato comprar do que tomar. Sempre

levaram tudo da citada região. Declarações de líderes de grandes potências sobre

“soberania compartilhada” e “patrimônio da humanidade” sempre pareceram demagogia

dirigida aos seus eleitores. Agora preocupam. Líderes se tornam prisioneiros da retórica.

Aventura militar pode render votos. As nossas defesas são frágeis. Possibilitam uma

intervenção internacional para “salvar o planeta” a baixo custo. Como no Iraque e nos

Balcãs, ficaríamos impedidos de voar. Os brasileiros estão divididos. Comunicação por

satélite seria silenciada e as cadeias de comando interrompidas. A Ásia está em vias de

ser subtraída da influência ocidental pela China. Problemas internos das grandes

potências tornaram-se graves. Uma intervenção fácil, barata, pelo nobre motivo de

salvar o planeta pode ser tornar oportuna.


Fortaleza, 30/9/20.

Rui Martinho Rodrigues.

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