A COMPLEXIDADE E A POLÍTICA
O conhecimento, fruto do esforço de
compreensão do mundo, pode ter como objeto pequenos fragmentos do real, ou
amplia-lo até o todo, que os físicos chamam “teoria de tudo” a fracassada
tentativa de unificar a explicação das quatro forças fundamentais da natureza. A
“Introdução à Logica”, de Imideo G. Nerici, diz: quanto maior o objeto mais
superficial o conhecimento. Por outro lado, a compartimentalização do saber
pode produzir graves erros. Karl R. Popper (1902 – 1994) propõe, como forma de
superar tal impasse o método hipotético dedutivo, na obra “A lógica da pesquisa
científica”. Popper reconhece o falibilismo de John Locke (1632 – 1704), inerente
ao conhecimento.
As ciências da natureza resistem ao
sonho da teoria de tudo. São hipotético-dedutivas. Observam, formulam hipóteses
e testam. Reúnem as válidas e deduzem conhecimentos complexos com base nas
hipóteses referentes aos componentes simples. As ciências da cultura nem sempre
podem testar hipóteses. Não podem repetir a Revolução Francesa para testar.
Pedro Demo (1941 – vivo), na “Metodologia científica das ciências sociais”, diz:
as ciências da cultura não vão além da hipótese. François-Marie Arouet (Voltaire,
1694 – 1778) combateu o dogmatismo nos “Ensaios sobre a tolerância”.
A vertente política que se apoia em
“teoria de tudo” propõe o planejamento central diretivo, do Leviatã. Fracassa,
como o absolutismo português, que concentrou recursos na aventura da navegação.
Realizou um feito extraordinário. Conquistou os dois lados do Atlântico Sul
quase todo, parte do Índico e um pouquinho do Pacífico. Sacrifício enorme, resultado
pífio. Fábio Pestana Ramos (1974 – vivo “No tempo das especiarias: o império da
pimenta”) relata a má qualidade dos navios, que em média duravam duas viagens.
A URSS fez o maior arsenal militar;
programa espacial; obteve vitória retumbante na guerra; ampliou o império
herdado dos czares; fazia excelentes armas, mas não uma geladeira que prestasse.
Faltou a ordem espontânea. Milovam Djlas (1911 – 1995), na obra “A nova classe”,
fala da elite do socialismo real, a “nomenklatura”, os “mais iguais” da fábula
de Eric Arthur Blair (Georg Orwell, 1903 – 1950).
Friedrich A. von Hayek (1899 – 1992), na
obra “O caminho da servidão”, ressaltou as realizações da modernidade, com a Revolução
Científica do séc. XVII que transformou o mundo com a Revolução Industrial. Solucionou
problemas. Mudanças históricas devem mais à solução de problemas do que ao
conflito entre as classes. Controlar o fogo, cultivar a terra, domesticar
animais, fundir metais fizeram o mundo avançar (Darcy Ribeiro, “O processo
civilizatório”).
A modernidade realizou mais em menos
tempo: objetividade, verificação de hipóteses, adotou a ideia que Popper
denomina “falseabilidade” para que uma tese seja validável. Estudou pequenos
fragmentos do real, como gravidade, inércia, fenômenos básicos. Obteve sucesso
de grande utilidade.
O elemento básico do
fenômeno social, o homem, tem protagonismo. É diferente nos fenômenos da
natureza. Tentativas de formular leis da História fracassam por isso. A
cegueira dos paradigmas (Thomas Kuhn, 1922 – 1996, “A estrutura das revoluções
científicas”); os obstáculos epistemológicos (Gaston Bachelard, 1884 – 1962, “O
novo espírito científico”); e a falta do distanciamento entre sujeito e objeto,
(Nicolau Maquiavel, 1469 – 1527, “O príncipe”), levaram a “teoria de tudo” nas
humanidades. O o Estado Dirigente foi fortalecido. O que dava certo, a ordem
espontânea, foi abandonada.
Fortaleza, 9/8/21.
Rui Martinho Rodrigues.
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