CHUVA: TRANSTORNO OU
FARTURA?
ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL DIARIO DO
NORDESTE EM 15/06/2020
Não
é de hoje que ouvimos as palavras transtorno
e tragédia entoar nos noticiários,
quando a abordagem é sobre uma chuva mais abundante. Também vem de longe o
bê-á-bá que o homem constrói em áreas de riscos ou impróprias, com a licença ou
às vistas grossas das autoridades; que faltam obras de drenagem, de proteção,
ou, quando presentes, são construídas ao arrepio das normas de engenharia; como
também de há muito se ouve falar de obstrução de galerias e outras passagens de
água, ação pouco civilizada.
Os
chamados transtornos, muito mais
presentes nas áreas urbanas, vêm complementando o já dito anteriormente, também
e sabidamente pelas ocupações desordenadas nas expansões urbanas, subornando
muitas vezes os planos diretores das cidades, por pressões sociais, movimentos
migratórios da zona rural e especulação imobiliária.
O
poder, via de regra, peca quando não age respaldado em três pilastras: apoiado
numa política habitacional, evitando ações depois do fato consumado; exercendo
rígida fiscalização e acompanhamento nas ocupações de áreas perigosas; e, no
mínimo, orientando sob cuidados e estudos geotécnicos, e não combatendo a
corrupção, que sempre se mistura a interesses de múltiplas naturezas.
Já
outro grupo de pessoas dá benza Deus
quando a chuva cai com generosidade, recarregando as barragens artificiais e
lagos naturais, o que proporciona condições satisfatórias para o plantio e a colheita
de grãos e forragens, água para as culturas perenes em perímetros irrigados,
para consumo animal, indústria e, por fim, para a sustentação do próprio homem
nas mais diversas formas de utilização.
A
agricultura irrigada e de sequeiro, a fruticultura, a floricultura e a bovinocultura,
notadamente a de leite, a avicultura, a ovinocaprinocultura e a aquicultura são
atividades rurais que asseguram renda e emprego, estancando ao mesmo tempo a
migração forçada pelas estiagens, (fenômeno antigo e ainda presente em menor
escala) altamente maléfica aos centros urbanos.
No
Ceará, segundo a IBGE/SEDET/SAN são hoje
cerca de 76 mil hectares irrigados, ( 25 % da área irrigável e 5% de toda área
cultivada ) produzindo frutas e
hortaliças e gerando algo próximo a 60
mil empregados diretos. O censo do IBGE 2017/2018 indicou que 928 mil pessoas
vivem do setor agropecuário do estado. Esse número abrange a aquicultura, a floricultura
e agricultura de sequeiro e a pecuária. Isso significa produção de alimentos
para a população, que necessita de apoio técnico agronômico e de insumos. Nesse
ponto um destaque: água, principal e
indispensável insumo.
Afinal,
a chuva traz transtorno ou benefício? É bem-vinda ou indesejada? É culpada ou
inocente? É vilã ou vítima? É divina ou infernal? Merece, pois, reflexões. Vejo
suas águas indo nas enxurradas de nosso inverno, comumente em novos caminhos retraçados
pelo homem, que nem a própria conhece. São xingadas por entrar e sair em residências,
plantações, estradas e logradouros urbanos, e por sobrar em canais apertados e
subterrâneos. Entendo que se voz tivessem também gritariam à procura da sua
ribeira de largura natural, profunda e emoldurada pela mata ciliar, que outrora,
mansa e seguramente, sem importunação, levava-as ao oceano. Louvemos a água!
Sagrado insumo da humanidade!
Eng.
Agrônomo Jose Flávio Barreto de Melo
Presidente da Associação de Eng. Agrônomos
do Ceará
Membro das Academias Cearense de
Engenharia e Brasileira de Ciência Agronômica
flaviobarreto.barreto@gmail.com
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