UMA CRISE NA FRONTEIRA
Temos uma crise na fronteira norte.
Distante dos nossos centros econômicos, das áreas de maior concentração
demográfica e de decisão política, não deixa de representar um grave problema.
A agonia da Venezuela transborda. Gera fluxos migratórios para Colômbia, Brasil
e países com os quais a pátria de Bolívar não confina, como Equador, Perú,
Chile, Argentina, Espanha e EUA. O Brasil recebe menos refugiados do que os
países citados por ficar longe dos centros mais populosos da Venezela e
oferecer possibilidades restritas de acolhimento na pequenina Pacaraima e em
Boa Vista.
Refugiados, ainda que em muito menor
número do que na Colômbia, sobrecarregaram os serviços de saúde de Roraima, trouxeram
doenças, geraram despesas. A hora, porém, não é para gastos. A
imprevisibilidade da crise exige que pensemos na possibilidade de um drama de
longa duração. Ditaduras totalitária são resilientes. A URSS viveu, durante a
coletivização das terras, uma fome na qual morreram milhões de pessoas. Mas o
regime sobreviveu. A China, depois do fracasso do Plano chamado Grande Salto,
entre 1958 e 1960, também viveu uma fome endêmica, mas o regime sobreviveu
lançando a Revolução Cultural, escolhendo culpados e radicalizando a repressão.
A ditadura nazista da Alemanha só caiu quando o exército soviético tomou
Berlim. Na Venezuela a associação com o narcotráfico, o controle de alimentos e
a cooptação dos militares dão ao regime comunista uma base aparentemente muito
sólida. A crise poderá ser longa.
Crises são impasses e oportunidades.
Ensejam, para grandes potências, movimentos no jogo geopolítico. O mundo
multipolar, após a Guerra Fria, trouxe de volta a figura da potência regional.
O Irã e a Turquia são exemplos de candidatos a tal posto. Ambas sofreram grave
crise econômica em razão do desgaste econômico e político causado pelo ônus de tentar
projetar poder, influência e prestígio nas suas regiões. Até a rica Arábia
Saudita vem sofrendo deficits enormes depois que assumiu a posição de potência
regional. Geopolítica é um jogo caro. Impõe a chamada sobrecarga imperial.
Grandes potências vergaram-se sob o peso da referida sobrecarga. Os EUA eram
uma potência incomparável quando se retiraram da China em 1949, abandonando-a
ao comunistas porque a sobrecarga imperial estava custando muito caro. Abandonaram
o Vietnam pelo mesmo motivo, como a URSS abandonou os seus aliados do
Afeganistão em fins da década de oitenta do séc. XX, abandonando, nos seus
últimos dias, os aliados do leste europeu. O Brasil foi potência regional no
rio da Prata. Tinha grandes ganhos com o café. Mas teve as finanças abaladas.
A Rússia ganha com a
queda na produção de petróleo na Venezuela, fato que favorece o preço do
produto importante para a economia Russa. Coloca uma pedra no caminho dos EUA,
desviando a atenção americana da Ucrânia, da Síria e de outros lugares. O Irã
tem ganhos semelhantes aos dos russos. Nós, porém, nada temos a ganhar. Só
temos a perder. Os EUA poderão aceitar um jogo prolongado com Caracas e demais
atores. Nós não temos essa condição. Jogo de grande não é bom para pequeno. Somos
pequenos, não obstante a nossa grandeza territorial e demográfica. A nossa economia
é pequena diante dos nossos problemas.
Fortaleza, 26/2/19.
Rui.
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