O
ARGUMENTO PROGRESSISTA
Progressista
é uma classificação política vaga ou imprecisa, como tantas outras. Supõe que a
História seja evolutiva, na forma de uma marcha triunfal. Mas admite diferentes
concepções de evolução. Deixa muito ao dispoir das supusições do leitor, o que
facilita o proselitismo. Como a obra de arte que cada um compreende ao seu
modo, forma consensos superficiais e oculta o dissenso. Assim, há quem se
considere progressista, manifestando preocupação com a natureza, com as boas
relações interpessoais e consigo mesmo. Sérgio Paulo Rouanet (1934 – vivo)
entende que só haveria progresso humano se nós tivéssemos melhorado as nossas
relações nesses três campos ao longo dos tempos, nega, porém, que as nossas
relações com o outro tenham melhorado e diz que os nossos conflitos íntimos e
as nossas relações com a naturea não melhoraram. Iisto é: nega o progresso
humano, a despeito dos enormes aperfeiçoamentos nos campos material, técnico,
científico e das instituições jurídicas e políticas.
Jacques
Le Goff (1924 – 2014), na obra História e memória (UNICAMP, 1996) também
distingue entre progresso técnico, das organizações políticas, jurídicas e
sociais e o da condição humana. Mas se não existe progresso humano, o que resta
do progressismo? O entusiasmo com a técnica os progressistas tendem a ver como
tecnicismo, termo pejorativo. O progresso científico é um pouco mais acatado,
mas não é o das cogitações progressistas. Auguste Comte (1798 – 1857) era
entusiasmado com a ciência, encarava o desenvolvimento cognitivo como o motor
da história. Mas os progressistas não se alinham com o positivismo, preferindo
considerar o conflito como a mola que impulsiona o progresso. O progressismo
não é técnico, científico, nem um aperfeiçoamento das relações humanas, já que
o conflito é o avesso da harmonia, mas não é nada disso, não havendo consenso
entre suas subdivisões.
Um dos
atrativos do progressismo resulta confusão entre o progresso humano e o das
instituições jurídicas, políticas e sociais. Mas, se os progressistas soubessem
disso oscilariam entre o reformismo voltado para as instituições e o
conservadorismo preocupado em preservá-las. O progressismo olha para a
organização das forças produtivas, não para a técnica, ciência ou instituições.
O ambientalismo pode invocar a condição de progressista alegando que defende o
aperfeiçoamento das nossas relações com a natureza. Mas seria preciso
contemplar os outros dois aspecto: a relação com os nossos semelhantes e do
homem com ele mesmo.
O
progressismo é filho do iluminismo. Carrega a semente da cientificização do
fenômeno histórico, social, político, psicológico e humano. A ideia de “leis da
história” é inspirada em Isaac Newton (1643 – 1727), com suas leis da Física.
Comte declaradamente tentou fazer uma Física Social, a qual depois denominou
Sociologia, juntando palavras latina e grega. Karl Heirinch Marx (1818 – 1883)
repudiou o positismo, mas Friedrich Engels (1820 – 1895), seu parceiro de toda
a vida, com quem escreveu em parceria a maioria dos seus livros, passa uma
visão de “leis da história”, claramente demonstrada na obra A dalética da
Natureza (Paz e Terra 1979), que cientificiza a “evolução humana” segundo leis
da natureza, bem ao modo positivista.
O
intelectual comunista Leandro Augusto Marques Coêlho Konder (1936 – 2014), na
obra A derrota da dialética (Editora Expressão Popular, 2009) admite a
existência do que chamou de incrustrasções positivistas no pensamento de Marx.
O relativismo e a crítica da indução e do dedutivismo, comum entre os que
colocam o conhecimento como a expressão do poder dominante, certamente não se
sentem confortáveis nesse progressismo. Desconforto haveria se soubessem de
algumas destas coisas;ou se o progressismo não tivesse mil e uma faces
distintas para acomodar os mais diversos entendimentos e, ainda, se a
dialética, que Lucio Colletti (1924 – 2001) considerava uma senhora de costumes
cognoscitivos fáceis, não os socorresse.
Fortaleza,
20 de fevereiro de 2019.
Rui
Martinho Rodrigues.
Publicado
no jornal on line focus.jor e no blog da ACLJ.
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