Na Hipocrisia do mundo você se descobre,
e, se encontra, quando vive um grande amor
Vicente Alencar

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2019

A CRÍTICA SOCIAL - Rui Martinho Rodrigues.


A CRÍTICA SOCIAL
Um professor de literatura, na Inglaterra, orientou a produção de um conto: um escândalo sexual, um mistério e a família real poderiam torná-lo mais atraente. Um rapaz fez o “dever de classe” escrevendo o seguinte texto: “a rainha está grávida e não se sabe quem é o pai”. A crítica social também tem uma receita mais diversificada. Defenda a igualdade, mas de modo vago. Não faça distinção entre desigualdade (que é jurídica, social, cultural) e diferença (que é física, legítima ou natural). Não distinga entre igualdade de todos em tudo; de todos em algo; de alguns em tudo; de alguns em algo; nem entre a igualdade de oportunidades e a de resultados. O relativismo servirá de panóplia. Não existindo verdade você jamais estará errado. Mas não deixe de invocar a verdade contra quem diverge de você. A dialética, que Lucio Colletti (1924 – 2001) considerava uma senhora de costumes cognoscitivos fáceis, será de grandr ajuda. Permite contradições escudadas na tese da unidade dos contrários. Use conceitos indeterminados, como justiça e dignidade humana. A exemplo do que ocorre com as obras de arte, cada um entenderá ao seu modo. Joaquim Maria Machado de Assis (1839 – 1908), no conto Teoria do Medalhão, já recomendava o discurso vago como forma de contornar divergências e aparentar sabedoria.
A responsabilidade individual por crimes deve ser abolida ou minimizada, mas seletivamente. Negue a possibilidade de escolha livre e consciente. Ninguém perceberá que isso é incompatível com a democracia. Atribua as nossas decisões e condutas às estruturas sociais, políticas, econômicas e culturais e o transgressor será vítima. Mas seja seletivo. Aponte a pobreza como causa do crime, ignorando a criminalidade dos ricos, sem deixar de condená-los, conforme a conveniência. Isso faz sucesso e a contradição não será percebida ou a senhora de costumes cognoscitivos fáceis o absolverá. Também não notarão que se a pobreza levasse ao crime, então os pobres seriam criminosos ou, no mímino, suspeitos, o que é um preconceito perigoso.
Pregue a solidariedade. Mas tenha o cuidado de estatizar as obrigações daí decorrentes, para que elas não recaiam sobre os seus ombros, mas sobre o Estado, cujo financiamento será parte do redistributivismo fiscal. Sim, distribuir a renda não pode faltar. Mas a renda a ser distribuída é a de quem ganha mais do que você, pois não seria preciso o Estado distribuir os seus próprios haveres. Proponha colher sem plantar. É a velha promessa muito simpática, da deusa grega Bem-Aventurança, mulher formosa e sedutora, que os críticos chamavam de Mentirosa. Confunda Direito com patrocínio e transforme direitos sinagmáticos com direitos potestativos, na forma de crédito sem obrigação. Direitos humanos devem ser ampliados até alcançar toda elástica categoria das chamadas necessidades básicas ou direitos sociais. Afaste a ideia de esforço, superação, responsabilidade, perseverança e outras virtudes. São valores desconfortáveis.
Pregue a necessidade de ter a mente aberta, mas aferre-se às suas convicções, não importa que elas tenham sido desmentidas pelos acontecimentos históricos em todas as suas experiências. Basta apoiar-se em autores de grande prestígio, de preferência que sejam muito lembrados, pouco lidos e ainda menos compreendidos. Não é preciso ser virtuoso, basta aparentar virtude, já dizia Nicolau Maquiavel (1469 – 1527).
Porto Alegre, 2 de fevereiro de 2019.
Rui Martinho Rodrigues.

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