PARTO
OU MORTE
Pós-modernidade
é o que vem depois da modernidade, sem aludir a substância? Ou a substância é a
negação da modernidade? Ou é a transição entre fases distintas da modernidade,
como a alta e baixa Idade Média?
Indica
a negação e a sucessão da modernidade. Esta enfatizava universalidades no campo
político, jurídico e valorativo; prezava o conhecimento objetivo, baseado na
razão e na capacidade de sobreviver à tentativa de falseá-lo, e por isso
válido, conforme Popper. Newton propôs enunciados sobre inércia, gravidade,
ação e reação em termos universais, no campo da ciência. A Revolução Francesa,
no campo político e jurídico, desfraldou a bandeira dos direitos universais,
opostos ao direito medieval, que distinguia nobreza, clero e plebeus.
A
pós-modernidade nega verdades objetivas e universais, alegando que “o ponto de
vista é apenas a vista de um ponto”, excluindo a possibilidade do conhecimento
objetivo; despreza o universalismo, em nome da especificidade e do
particularismo; afasta a indisponibilidade dos direitos fundamentais em nome de
fins supostamente excelsos; destrói as referências sem as quais só resta senão
a força como meio de dirimir conflitos. Negar referências e falar em valores
excelsos é a própria contradição nos termos.
A
História é cíclica, conforme Toynbee. A civilização helênica floresceu,
desenvolveu-se e feneceu. Os romanos repetiram a trajetória dos gregos. A
civilização ocidental globalizou-se. Agora o mundo vive uma profunda crise. Não
especificamente econômica, mas no âmbito das instituições, dos valores, das
referências em geral, exageradamente relativizadas e banalizadas, a exemplo dos
últimos dias das civilizações retrocitadas, das quais descente. Pode ser o
parto de uma nova etapa da civilização ocidental, ou a sua morte. Parece haver
um processo de degeneração da democracia, que segundo Aristóteles, daria lugar
à demagogia, que hoje chamamos populismo. A costura do tecido social se faz
rota, na ausência de referências.
A
tentativa de impor novos marcos se mostra inviável. Tentam oficializar a moral
“politicamente correta” que só tem exacerbado os ânimos e estimulado a
intolerância, ao modo da inquisição, patrulhando palavras “heréticas” com um index do léxico proibido. A modernidade
era laica. A pós-modernidade adota um laicismo falso. É sectária. Não se trata
de alta baixa modernidade. São coisas distintas.
Brincadeira
de mal gosto, antes ignorada, passou a ofensa intolerável. O individualismo
hipertrofiado, com a ilusão da liberdade de ser, em lugar da liberdade de agir,
é proposto ao lado do coletivismo sufocante, dos comitês aparelhados, formando
uma mistura contraditória.
O
crime, o terrorismo, a falta de referências e a licenciosidade epistemológica
ameaçam a modernidade, ao ameaçar os direitos fundamentais e indisponíveis, a
exemplo do devido processo legal, da presunção de inocência e do respeito à
liberdade negocial no campo da licitude, porque são reflexos da perda de
referências. O relativismo laxista e a hipertrofia do bem público esmagam o
indivíduo alegadamente para protege-lo.
Lava
jato e Donald Trump são exposições das vísceras da pós-modernidade.
Fortaleza,
07 de março de 2017
Rui
Martinho Rodrigues
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