A DIVERSIDADE EXCLUDENTE
A diversidade passou a ser a palavra de
ordem do momento. É uma forma de exaltação do pluralismo democrático. A
tolerância foi apresentada por John Locke (1632 – 1704), na obra “Cartas sobre
a tolerância”, com o sentido de esteio da paz e da liberdade. O pensador citado
não propunha uma tolerância seletiva, que seria um sofisma. Renomeada como
diversidade, talvez para afastar o atavismo com o autor liberal, a ideia
ressignificada não é uma proposta de paz ou tolerância. Trata-se de
intolerância e combate com aqueles apontados como opressores. O acirramento de
ânimos em todo o mundo guarda relação com a intolerância que usa diversidade
como pseudônimo.
Poderia ser uma intolerância legítima se
dirigida apenas aos atos verdadeiramente racistas, xenófobos e demais condutas
agressivas. Mas temos sob o rótulo de aparência inclusiva o ataque aos adeptos
da moral tradicional, acoimada de preconceito, embora incida sobre algo que se
sabe o que seja, não sendo a expressão antecipada de um juízo de valor (pre + conceito),
por parte de quem não sabe o que seja o objeto ajuizado. Não se trata de
crítica ao pensamento conservador, mas ataque. A crítica deve ser livre. Mas
independentemente do que se possa pensar sobre um juízo de valor e da crítica
que se possa merecer, confundi-lo com preconceito é um erro ou má-fé,
A inclusão excludente não recepciona,
como parte da diversidade apregoada, a tradição judaico-cristã, salvo se
secularizada, isto é, historicizada, transformada de teocentrismo em doutrina
antropocêntrica, portanto substituída por outra doutrina sob a camuflagem da
tradição confessional. Apresentar algo por distinto do que realmente é
configura equívoco ou endrômina. Desqualificar os valores tradicionais como algo
desprezível (preconceito) ou torpe (discurso de ódio) é incompatível com o
discurso que apregoa a tolerância renomeada como inclusão ou diversidade.
Inversamente, invocar uma tradição que
prega perdão e amor como defesa da licenciosidade é desconhecimento ou
desinformação. O caso exemplar da mulher adúltera na iminência de ser
apedrejada, salva pelas palavras do Messias, que desafiou quem estivesse sem
pecado a atirar a primeira pedra, foi seguida, logo após, de exortação que
dizia: vai e não peques mais (João, 8;3-11). Não é preciso seguir a tradição
judaico-cristã para compreender que a tolerância do episódio citado não é uma
renúncia ao exercício da exortação e da reprovação de condutas havidas como
impróprias.
A exacerbação de ânimos tornou-se perigosa.
O exercício de direito de livre expressão do pensamento, por parte de quem
resiste ao movimento de mudança cultural forçada desencadeou a conflagração das
sociedades. Quando não havia resistência à revolução dos costumes, fosse por
tolerância ou por falta de percepção do alcance da transformação no campo
axiológico, havia paz, aquela dos cemitérios. Só um grupo falava. As novas
tecnologias e o aprofundamento da mudança cultural, revelando mais claramente o
seu significado, estimulou a resistência. Então o discurso de tolerância
renomeada como diversidade exibiu a sua essência intolerante.
A relação entre a
mudança cultural e a política nem sempre se mostra claramente. Mas o direito à
livre expressão do pensamento; a liberdade de consciência, que é mãe de todas
as liberdades; e o direito ao exercício da crítica, que é a essência da
democracia, estão intimamente associados ao mundo da política. A preservação de
referências valorativas é indispensável ao Direito. Quando o niilismo se
instala não há distinção entre licitude e transgressão.
Fortaleza, 26/1/22.
Rui Martinho Rodrigues.
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