O NEVOEIRO E OS
NAVEGANTES
Como será o financiamento das campanhas?
Como o eleitorado reagirá à desmoralização da vida pública? Não é possível
responder a estas indagações com segurança. Espera-se um aumento dos índices de
renovação das casas legislativas, que já eram muito elevados. Mas não se sabe
se haverá renovação de atitudes; qual será a influência do poder econômico e da
“máquina” governamental. Temos um nevoeiro com baixa visibilidade.
O Ceará já teve alternância no Poder, sem
renovação de condutas. UDN e o PSD se revezavam no governo. Pequenos partidos
eram os fiéis da balança. Cobravam caro por isso. Não em dinheiro. No poder
nomeavam os seus eleitores e demitiam os do adversário. Isso configurava uma
forma tosca de seguro desemprego: Era temporário; só durava até o adversário
voltar ao poder; pagava pouco; não era preciso trabalhar. Tudo como um seguro
desemprego. Era distribuído segundo critérios partidários.
Havia oposição porque as empresas não
dependiam tanto do aparato estatal. Não havia tanto incentivo ou amparo oficial
aos negócios. Nem o Estado era um comprador tão importante. Empresários eram
mais independentes. Prefeitos também não tinham tantas formas de cooperação com
o Estado ou com a União. Não havia o presidencialismo de cooptação, porque
tínhamos menos Estado na economia. O voto rural superava em muito o voto
urbano. O camponês vota no “coroné” por lealdade pessoal, por laços de
parentesco, amizade ou compadrio, que era uma forma de parentesco ritual. Não
havia tanta despesa nas eleições. Além da troca de favores era preciso matar um
boi para alimentar os eleitores, gastar algum dinheiro para transportá-los, já
tendo gasto um pouco para qualifica-los na Justiça Eleitoral. Não se gastava
com marqueteiro, filmes, aviões ou helicópteros.
Não havendo tantos gastos, não havia
tanta extorsão (tecnicamente concussão) nos negócios com o Poder público.
Depois de uma vida dedicada à política os homens públicos não iam além da
acumulação de algumas aposentadorias, sem nenhuma semelhança com os bilhões
amealhados hoje. Não ficavam ricos. O casuísmo das obras públicas não era tão
prejudicial. A estrada feita para o aliado político transportava bens para toda
a sociedade; o açude fornecia alimento para o mercado, sem distinção. Por tudo
isso havia partidos ou cooperativas de poder assemelhados a agremiações
políticas.
Hoje só existe um grande partido: o
governista. O favoritismo atrai irresistivelmente. Agora, porém, o favoritismo,
em meio ao nevoeiro, já não é tão certo. O mundo passa por uma onda de rejeição
dos políticos. Surpresas são consideradas nos cálculos. O horror à perda do
poder ou dependência das tetas da “viúva”, leva os irreconciliáveis à
conciliação. Mas como o eleitor reagirá? A chorosas vítimas do “golpe” farão
aliança com os “golpistas”? Já se disse que a política é dinâmica. Mas o velho
Tancredo Neves gostava de lembrar que a sabedoria é um bicho que quando cresce
demais engole o dono.
O tempo dará todas as
respostas e Paulinho da Viola aconselha: “faça como o velho marinheiro, que
durante o nevoeiro, leva o barco devagar”.
Fortaleza, 20 de
novembro de 2017
Rui
Martinho Rodrigues.
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