O
ATO E FATO
O
ministro Dias Toffoli declarou que o Brasil vive um semipresidencialismo e o
STF é um Poder Moderador. É verdade, mas fere a CF/88. Admitir publicamente o
abuso foi uma escolha consciente ou um descuido? O exame dos fatos deve começar
pelo sentido das palavras usadas para referi-los. Semipresidencialismo é uma
forma de organização política que reúne características do presidencialismo e
do parlamentarismo, com as responsabilidades executivas divididas entre o
Presidente da República, o primeiro-ministro e o gabinete. França, Finlândia e
Portugal são exemplos disso. O presidencialismo reúne as funções de chefe de
Estado e chefe de governo em um só cargo, exercido por uma só pessoa, separando
as competências dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.
A
CF/88 é presidencialista. Não temos primeiro-ministro. Não temos poder
moderador desde o fim da monarquia, quando o imperador exercia tal poder.
Trata-se de um poder acima dos demais poderes. O sistema de freios e
contrapesos, da Carta Política vigente, busca o equilíbrio entre os poderes,
distribuindo as competências para que cada um seja um freio para os demais. O
Poder moderador se choca com a harmonia e a independência entre os poderes.
O ministro disse o
óbvio. Admitiu que o STF está rasgando a constituição e que a ordem
constitucional foi rompida. O desrespeito à Carta Política vigente é confessado
por um membro do STF, cujos ministros se colocam como poder absoluto. Diante da
usurpação do poder e da ostensiva declaração a sociedade permanece passiva. O
Senado, que deveria exercer o contrapeso em face do STF, está intimidado em
razão dos processos movidos contra numerosos senadores, na nossa Suprema Corte.
A lição é clara: uma vez instaurada uma ação judicial contra um senador o seu
afastamento das funções parlamentares deveria ser automático, como acontece com
o chefe do Executivo quando tem início um impeachment.
O chefe do Executivo
foi eleito, mas não governa. A escolha das urnas não foi aceita pelos
“esclarecidos”, que desrespeitaram a vontade dos eleitores valendo-se de
brocardos latinos, contorcionismos hermenêuticos, investigações, processos e
prisões, sempre em nome do Direito. Até um inédito “direito extraordinário” foi
invocado, quando o STF afastou o presidente da Câmara dos Deputados.
Arbitrariedades contra determinadas personalidades foram toleradas muitas vezes.
O “Direito extraordinário” contra Eduardo Cunha, o vilão; o “Poder Moderador”
do STF contra o presidente conservador, dado a declarações polêmicas e sem a
base parlamentar do presidencialismo de coalisão ou cooptação.
A princípio o ministro
Barroso obrigou a Câmara dos Deputados a seguir um rito processual distinto do
previsto no Regimento da casa; o ministro Alexandre de Moraes foi escolhido sem
o procedimento aleatório para o “inquérito do fim do mundo” e investigou
conduta não tipificada como crime (fake news), contrariando parecer do PGR (a
persecução penal é prerrogativa exclusiva do Ministério Público); decretou
prisão de deputado, estabeleceu fiança e depois recusou-a (deputado só pode ser
preso por crime inafiançável); considerou flagrante com base em vídeo (por
tempo indeterminado!) e proibiu deputado de falar (a imunidade parlamentar é por
palavras). O ato do ministro Toffoli, declarando a verdade, agrava o fato que é
um poder absoluto exercido em nome do
Direito.
Um poema de Martin
Niemöller (1892 – 1984) diz: “...levaram meu vizinho que era judeu (...);
[depois] levaram meu outro vizinho, que era comunista; [depois]; vieram e me
levaram; já não havia ninguém para reclamar”.
Fortaleza21/11/21.
Rui Martinho Rodrigues.
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