TEXTOS DE UM COMEÇO
1) A vida sempre a nos dar lições.
Chego ao meu ‘habitat’’, à noitinha. Ligo as lâmpadas da sala e da cozinha. Num imediato, um estalo faz-me ver que a lâmpada da sala se apagara; numa rápida inspeção, vejo que ela queimara, enquanto a outra seguia acesa. Olhei de novo e vi que o pagão da lâmpada dera-lhe uma cor escura, opaca. O brilho da luz fugira, embora, fluísse ainda, em vão, corrente elétrica.
Levou-me aquele momento a duas reflexões, que ora partilho:
A primeira transportou-me para a afirmação de Jesus: ‘Eu sou a Luz do mundo’. Ele não disse: Eu sou a lamparina ou a tocha. E aquela lâmpada ali, incendiada de luz, de repente, esvai-se e se apaga. Ora, a Luz nunca se apaga, mesmo se vier a escuridão; ao contrário, na escuridão, ela realça ainda mais o seu brilho, afastando toda ‘cegueira’ e deixando o caminho e os arredores iluminados. E Jesus, sendo a Luz, Ele próprio, não há sombras que Lhe apaguem.
A segunda reflexão, trouxe para dentro de nossa vida diária. Somos movidos a energia. Ela acende nossos sonhos e ilumina nossos caminhos. Os pensamentos funcionam como capacitores com suas placas sinápticas. A lâmpada conjuga a objetividade de nossa mente e a determinação de nossa vontade. Acesa, indica o bom uso de nossas energias a clarear o percurso para a conquista de nossos objetivos colimados. Na presença da luz, os percalços são superados e os perigos, contornados. A pontaria do ‘estilingue’ iguala-se à ‘alça de mira’.
Quando, por algum motivo, apagamos a lâmpada, a mente capitula, a vontade enlanguesce e, então, a luz fenece; porém os capacitores continuam funcionando. E como não temos armazenamentos ‘estanques’ de energias, a dinâmica de sua produção condu-las para outros fins, ignotos, maliciosos e danosos, perdidos na escuridão de mente e vontade.
E ‘conquistamos’ o que não queremos, alçando-nos como caçadores sem caça e lamentando ‘qualquer coisa’ que surge nas esquinas do acaso.
E a fé, perguntam?
Ora, a fé não é uma ficção, nem uma magia, senão uma adesão da mente determinada pela vontade.Foi ontem.
Presenciei um fato não tão raro, nesses tempos de tolerante intolerância.
Dirigia o carro, tranquilamente, pelas ruas de minha cidade. Mais, à frente, o sinal fechou e dei um stop atrás de um táxi.
Fazia sol, mas uma brisa que soprava agradável me dizia ser melhor que o ar condicionado do veículo. Mantive-o, então, ao alvedrio do clima.
Mal o sinal abriu, duas senhoras idosas lhe fizeram sinal e o motorista aguardou, enquanto elas entravam, vagarosamente, no automóvel. Não apresentavam ser portadoras de deficiência, porém a idade já lhes pesava um pouco.
Aguardei, compreensivo e silencioso.
O moço, parado atrás de meu auto, começou a buzinar impertinente e, num arroubo de intolerância e brutalidade, pôs a cabeça pela porta dianteira de seu lado e bravejou:
- Vamos, seu po***, seu felha da p***.
O motorista do táxi não perdeu a tranquilidade e esperou as duas senhoras adentrarem seu veículo para dar marcha no mesmo.
Cá com meus botões, vi uma cidadania ferida e ultrajada. O respeito aos direitos humanos, a dignidade das pessoas esbarram na conveniência pessoal, no estresse de uma sociedade loquaz procurando esconder sua grave doença distímica.
O motorista foi o mais cidadão. E, como não existe mais cidadão nem menos cidadão, sua resposta silenciosa atendeu aos direitos das duas cidadãs, com uma atitude cidadã.
Cidadania, cada dia, apequena-se para desaparecer nos discursos ocos de compromissos e cheios de hipocrisias.
Quanto mais dela se fala, menos frequenta nossa sociedade, nossas instituições, nossos encontros e relacionamentos.
Há uma loucura no ar, tomando conta do ânimo de muita gente, de tal modo que ‘rudeza’ campeia nos comportamentos, sem, às vezes, sequer tangenciá-los.
Conta-se que, certo dia, num treinamento, o instrutor disse a seus dois treinandos:
- Estão vendo aquele monte à frente? Amanhã vocês deverão escalá-lo até o topo com caroços de feijão nos seus tênis.
Anoiteceu e a manhã chegou, radiante, com seus tênues raios e uma brisa suave acariciava seus corpos.
Antes mesmo que o instrutor os chamasse, já estavam preparando-se para a façanha.
Um apito escalonado e um gesto de mão deram o sinal da largada.
E lá se vão os dois. Caminharam até o sopé do morro e, então, encetaram a subida. Não era tão íngreme quanto desafiadora.
Lá, em cima, o instrutor os esperava, aguardando o desfecho de tal feito. É que ele havia contornado o morro e subira pela parte quase plana.
Seguiam os dois em ritmo normal, porém um deles fez algumas paradas, apoiando-se em pequenos arbustos que o margeavam.
E a subida continuava sem tantos obstáculos naturais.
Os dois chegaram ao topo, com diferença de cerca de vinte minutos. Um deles agitava sua bandeira de chegada, e o outro, com os pés sangrando e reclamando do sofrimento devido aos caroços de feijão ferindo seus pés. O outro, porém, estava bem e comemorava seu êxito.
Então, perguntou-lhe o treinador, enquanto descansavam do cansaço da subida:
- Por que o seu colega lamenta tanto, enquanto você comemora, com entusiasmo?
Respondeu-lhe, incontinenti, o moço:
- Ora, eu cozinhei os caroços de feijão, e só depois os pus no tênis. E, assim, eles amaciaram a planilha do tênis e não me causaram mal-estar na escalada.
O instrutor elogiou a sabedoria desse rapaz, que agira além do conhecimento, pois não havia laborado em astúcia, nem na esperteza da desonestidade. Ele havia escalado com os caroços de feijão no tênis, como lhe fora ordenado.
A sabedoria não está nos bancos das escolas nem nos laboratórios de universidades. Seu PHD é a simplicidade de ver, sentir, perceber e compreender o viver, na vida que o envolve.
O conhecimento não se basta. Necessita da sensatez da sabedoria para não perder a lucidez e aprofundar-se na insensatez.
O conhecimento tanto pode formar tolos como tiranos.
Ano Novo.
Quantas vezes, em todos os anos de nossa vida, saímos de um ano velho para galgar um Ano Novo?
Fazemos planos e o saudamos com certo ânimo aparente de seriedade.
No ano seguinte, repetimos a mesma rotina. Os planos não são perseguidos, mas, justificado seu naufrágio, são objeto de nova proposta, já condenada ao olvido inclemente.
Nós apenas encapamos, mudamos de capa. A ‘máquina nova’ continua com engrenagens velhas e surradas.
Entra ano e sai ano, jovens ficamos adultos, adultos envelhecemos e os desejos permanecem emoções inocentes alheias a atitudes decididas.
Escassez de coragem e determinação.
Covardia e desprezo de nossas 'ambições'.
Vivemos, então, de embalagens sucessivas, que nos empolgam com seus ouropéis e nos enganamos a nós próprios, numa incoerente magia de apenas novas roupagens decrépitas. Enganamo-nos ou somos manipulados pela mania de belos desejos insustentáveis?
Vaidade sem autoestima. Orgulho sem humildade. Autossuficiência sem congruência.
Ajuizamos as mesmas propostas, ajustamo-nos aos mesmos erros, ao ritmo de comidas, bebidas e danças.
Cantamos adeus, ano velho. Gritamos Feliz Ano Novo e dançamos ao Viva o ano novo, sorvendo acachapantes taças de champanha. Todavia, permanecemos, em cada ano, mais endividados conosco, o envelhecer aproximando-se com pinturas remendadas de mudanças temporais e sonhos desencarnados. Odres velhos de tanto serem reciclados rompem-se, espalhando no chão sedento e voraz o sabor de vinho jamais bebido.
Ano Novo de grilhões, que se reforçam em prisões que nos retêm, sorrindo, enquanto as oportunidades passam, cegas e mudas.
Um há de chegar para nos despertar desses eventos paralisantes, para nos sacudir o torpor de malsã rotina e nos atirar dentro dos ardores da vida e de tantas oportunidades.
Um ano novo de arrojado ânimo novo e de engrenagens novas, é o que desejo, com as bênçãos de Deus!
Avante, enquanto energias vibram!
E que nunca nos faltem a fé e o amor!
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