Antonio Prada
Às vésperas da Copa, e tentando se descolar das questões mais espinhosas que cercam a infra-estrutura e a organização do evento, a Fifa foi ao ataque durante esta semana. Com a inevitável nova onda de protestos e uma avalanche de críticas de todos os lados, a entidade tenta, no conjunto da obra, salvar a própria pele.
A estratégia, captada em todas as declarações da semana, é reforçar, e separar, as responsabilidades da Fifa e do governo. Mas vai além: começa a lavar roupa suja e a dar nomes aos bois. Os alvos, claro, são governo e Estado brasileiros. Antes, aliados de sangue. Agora, inevitáveis parceiros indesejados.
Vamos aos fatos, ou melhor, às aspas de Jérôme Valcke, secretário-geral da Fifa, todas fornecidas bem longe das fronteiras do Brasil.
Em evento na segunda, dia 7, em Lausanne, Suíca, ao lado de Gilbert Felli, o interventor do COI para os Jogos do Rio de 2016:
Vivemos um inferno “Quanto à crítica sobre as despesas, é verdade que nós (Fifa) temos uma responsabilidade moral. Dou um exemplo: num dado momento havia um certo número de pessoas, no Brasil, entre eles, políticos, que se opunham à Copa do Mundo. Vivemos um inferno, sobretudo porque no Brasil há três níveis políticos, houve mudanças, uma eleição (de Dilma Rousseff), mudanças, e não discutíamos mais necessariamente com as mesmas pessoas. Foi complicado, porque a cada vez tínhamos de repetir a mensagem.”
 Não simplesmente um governo “Talvez (no futuro) tenha de ser a mais alta autoridade representante do povo que seja associada a uma decisão de uma candidatura e não simplesmente um governo, um chefe de Estado e seus ministros que passam com o tempo. Que seja uma representação global do País”
Como você pode duvidar do Brasil? “Lembro que me diziam: como você pode duvidar do Brasil? Nós organizamos o Carnaval do Rio todos os anos com 3 milhões de pessoas. Mas no carnaval são pessoas do Rio e que tem seus apartamentos lá. Estão na praia e ficam por lá. As pessoas achavam que era fácil organizar uma Copa. Mas é um trabalho de verdade. É uma responsabilidade real”
Em entrevista ao jornal suíco Le Matin, na terça-feira, dia 8:
Os brasileiros se manifestam contra a corrupção, não contra Fifa “Eles (brasileiros) se manifestam contra a corrupção, contra a decisão de aumentar o preço do ônibus, pela saúde e pela educação”, rejeitando a tese de que a manifestação ocorra contra a Fifa. Valcke afirmou ainda que é errado fazer a ligação entre os gastos públicos com a Copa e o que poderia ser gasto em outros setores
Em entrevista às agências internacionais esta semana em Zurique, na Suíça:
Brasil não é Alemanha “Não apareçam no Brasil pensando que é a Alemanha, que é fácil se mover pelo país. Na Alemanha, você poderia dormir no carro. No Brasil não. O maior desafio será para eles (torcedores). Não será para a imprensa, não será para os times e nem dirigentes. Será para os torcedores”
Tiveram 5 anos para entregar “Sabíamos disso (dos limites do Brasil em relação à infra-estrutura de aeroportos). Mas isso era em 2009 e podemos esperar que você tem cinco anos para um país garantir que as estruturas estejam instaladas para entregar o que havia sido acordado”.
A Fifa só pediu 8 sedes “É verdade que você multiplica os riscos ao ter mais estádios. Mas tivemos uma situação em que tínhamos um governo e um presidente, que naquele momento era Lula, que te explicam que a Copa deve ser para todo o Brasil, e não apenas para poucas cidades” (Segundo ele, foi o governo brasileiro, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e Ricardo Teixeira que fizeram questão de insistir com a Fifa de que a Copa teria de ocorrer em 12 cidades e que as seleções não poderiam ficar em apenas uma região do País. A Fifa pede apenas oito sedes)
 Não foi fácil sair de Lula para Dilma “Encaramos uma eleição geral no Brasil e não foi fácil sair de Luiz Inácio Lula da Silva para uma nova presidente. Sempre leva algum tempo para um novo governo entrar nos assuntos e tivemos também um número elevado de mudanças de ministros”.
Falta de apoio nacional “Não pode ser apenas a decisão do presidente ou de um ministro. Mas deve ser apoiado pelo senado, congresso ou assembleia nacional (a decisão de escolha de um país para ser sede de um Mundial) . Isso evitaria “potenciais conflitos”.
Como se lê, nada de Fair Play, ao menos fora de campo. E a Copa ainda nem começou.