Na Hipocrisia do mundo você se descobre,
e, se encontra, quando vive um grande amor
Vicente Alencar

sexta-feira, 2 de maio de 2014

Chuva de Versos n. 115



Uma Trova de Fortaleza/CE
FRANCISCO JOSÉ PESSOA

Dos artigos que componho
nas minhas noites sozinhas,
fazes parte do meu sonho
abraçada às entrelinhas.

Um Trova Premiada de Santos/SP
ANTÔNIO COLAVITE FILHO

No estúdio, ao fotografar
um gordo fazendo pose:
"- Três por quatro? Nem pensar!
Só cabe em nove por doze!!!”

Uma Trova Premiada  em Caxias do Sul/RS, 2014
MANOEL CAVALCANTE DE SOUZA CASTRO (Pau dos Ferros/RN)

A brisa, leve em seu canto,
na voz de um timbre sem dono,
é quem solfeja o acalanto
pra noite pegar no sono...

Uma Trova de Juiz de Fora/MG
MAURO MACEDO COIMBRA

É magia que me encanta
e que a Deus mais enaltece:
a raiz sustenta a planta,
mas quase nunca aparece!

Um Poema Do Rio Grande do Sul
ADAIR DE FREITAS

Meu Canto 

Meu canto não conhece desencanto
Vem peleando a tanto tempo
Mas não cansa de pelear
Hoje já se ouve a ressonância
Dessa voz de peão de estância
Conquistando seu lugar
Meu canto, se quiser eu te ofereço
Pois ninguém me bota preço
Quando não quero cantar
Meu canto, companheiro, não se iluda
É como um cavalo de muda
Que cansou de cabrestear

(Meu canto tem cheiro de terra e pampa
É um andejo que se acampa
Tendo o mundo por galpão
Grita pra que o mundo inteiro ouça
É raiz de muita força
Rebrotando deste chão)

Meu canto, não é mágoa, não é pranto
Nem passado, nem futuro,
Que o presente é mais verdade
Hoje o amanhã não me fascina
Tenho o ontem que me ensina
Mas não vivo de saudade
Canto nesta terra onde me planto
Mas não pise no meu poncho
Que eu empaco e me boleio
Canto pra pedir mais igualdade
Quem não gosta da verdade
Que se aparte do rodeio

(Meu canto tem cheiro de terra e pampa
É um andejo que se acampa
Tendo o mundo por galpão
Grita pra que o mundo inteiro ouça
É raiz de muita força
Rebrotando deste chão)

Canto, e minha voz quando levanto
Não traz ódio nem maldade
Coisas que não sei sentir
Não que seja mais que qualquer outro
Nem mais taura, nem mais potro,
Se disser eu vou mentir
Peço pra quem julga e dá conceito
Que esqueça o preconceito
E me aceite como sou
Manso como água de cacimba,
Mas palanque que não timbra
Porque o tempo enraizou

(Meu canto tem cheiro de terra e pampa
É um andejo que se acampa
Tendo o mundo por galpão
Grita pra que o mundo inteiro ouça
É raiz de muita força
Rebrotando neste chão)

Trovadores que deixaram Saudades
GUERRA JUNQUEIRO  
Trás-os-Montes, Portugal (1850 – 1923) Lisboa/Portugal

A primavera opulenta,
rica de cantos e cores,
palpita, anseia, rebenta,
em cataclismo de flores.

Um Poema da Espanha
ÁNGEL GONZÁLEZ
Oviedo/Espanha 1925 – 2008 Madri/Espanha

Preâmbulo a um silêncio

Porque tem consciência da inutilidade de tantas coisas
às vezes uma pessoa senta-se tranquilamente 
à sombra de uma árvore – no verão –
e cala-se.

(Disse tranquilamente?: falso, falso:
uma pessoa senta-se inquieta fazendo estranhos gestos,
calcando as folhas abatidas
pela fúria de um Outono sombrio,
destruindo com os dedos o cartão inocente de uma caixa de fósforos,
mordendo injustamente as unhas desses dedos,
cuspindo nos charcos invernais,
golpeando com o punho fechado a pele rugosa das casas 
que permanecem indiferentes à passagem da primavera,
uma primavera urbana que faz assomar com timidez 
as madeixas dos seus cabelos verdes lá no alto,
por trás do zinco escuro dos algozes,
levemente arraigada à matéria efêmera das telhas
            prestes a tornar-se pó).
Isso é certo, tão certo
como eu ter um nome de asas celestiais,
arcangélico nome que a nada corresponde:
Ángel,
dizem-me,
e eu levanto-me disciplinado e direito
com as asas mordidas
(tradução: Helder Moura Pereira)

Um Indriso de Coromandel/MG
SÔNIA DE FÁTIMA MACHADO SILVA

Tardes de abril

 Escancaro a janela ...  sinto o ar ainda morno
filtrado pela brisa já quase despida de sol
a soprar as leves folhas amarelas...

Meu pensamento rodopia ao longo da rua
misturado às folhas e saudades
sob um  ocaso luminoso e outonal...

Dançam as folhas dos arvoredos...

Recolho-me às minhas lembranças…

Um Haicai de São Paulo/SP
FRANCISCO HANDA

Borboleta

Nas ruas do porto
sem nenhuma direção
uma borboleta.

Um Poetrix de Osório/RS
SUELY BRAGA

O pensamento voa
    ao sabor do vento
    com o pássaro que revoa.

Um Poema de Lisboa/Portugal
MÁRIO CESARINY
(Mário Cesariny de Vasconcelos)
1923 – 2006

Em Todas as Ruas te Encontro

Em todas as ruas te encontro
Em todas as ruas te perco
conheço tão bem o teu corpo
sonhei tanto a tua figura
que é de olhos fechados que eu ando
a limitar a tua altura
e bebo a água e sorvo o ar
que te atravessou a cintura
tanto, tão perto, tão real
que o meu corpo se transfigura
e toca o seu próprio elemento
num corpo que já não é seu
num rio que desapareceu
onde um braço teu me procura
Em todas as ruas te encontro
Em todas as ruas te perco

Um Soneto de São Paulo/SP
COLOMBINA 
(Yde (Adelaide) Schloenbach Blumenschein)
1882 – 1963

Episódio 

O reflexo do ocaso ensangüentado
dourava ainda aquele fim de dia . . .
De um frasco de cristal, mal arrolhado,
um cálido perfume se esvaía...

Junto ao teu corpo nu, convulsionado,
que de desejo e de volúpia ardia,
o meu corpo, nessa hora de pecado,
uma ânfora de gozo parecia.

Na quietude da tarde agonizante
um beijo prolongado, delirante,
a flama da paixão veio acender...

E toda a minha feminilidade
era uma taça de sensualidade
transbordante de vida e de prazer!

Um Triolé do Rio de Janeiro/RJ
MACHADO DE ASSIS
(Joaquim Maria Machado de Assis)
(1839 – 1908)

Flor da Mocidade

Eu conheço a mais bela flor:
És tu, rosa da mocidade,
Nascida, aberta para o amor.
Eu conheço a mais bela flor:
Tem do céu a serena cor
E o perfume da virgindade.
Eu conheço a mais bela flor:
És tu, rosa da mocidade.
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O que é Triolé?
Pequeno poema de forma fixa. Originário da França (triolet), ao mesmo tempo em que o rondel e o rondó, com os quais é confundido; o triolé tem sua própria estrutura poética. Deschamps, poeta francês medieval, julgava-o igual ao rondel, e assim há quem o considere até hoje. Caiu em desuso (completo) no século XVI e foi reerguido, na metade do século XIX, pelos poetas parnasianos. Dentre os nossos que experimentaram o triolé, destaca-se um nome ilustre, Machado de Assis.

A estrutura do triolé consta do seguinte: uma oitava, ou mais, com duas rimas apenas, de modo que o primeiro verso repete no quarto, e os dois primeiros fecham a estrofe, como o sétimo e oitavo, assim: ABaAabAB (as maiúsculas representam os versos que são repetidos como estribilho).
Consta de estrofes de oito versos, em duas rimas, com a seguinte disposição: abaaabab. O 1.º, o 4.º e o 7.º versos são iguais.
(Ricardo Sérgio in Recanto das Letras)

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